9º Congresso Internacional da Anamatra termina com palestra sobre os direitos fundamentais no Direito do Trabalho francês

Professor Antoine JEAMMAUD fala da influência das normas internacionais e da jurisprudência na efetivação de direitos na França

A importância dos direitos fundamentais para o Direito do Trabalho na França foi o tema da palestra do professor Antoine JEAMMAUD, da Universidade Lumière Lyon 2, no encerramento do 8º Congresso Internacional da Anamatra nesta sexta (24/2). Esta edição do evento, realizado bienalmente pela Anamatra, reuniu 120 juízes do Trabalho na França, que debateram questões atuais para o Direito do Trabalho francês, bem como conheceram o funcionamento do Poder Judiciário no país. 

No início de sua exposição, JEAMMAUD ressaltou que o Brasil, diferentemente da França, dedica uma grande importância ao direito social, em especial na Constituição Federal de 1988. Segundo o professor, a Constituição francesa atual (1958)  - até mesmo a Quarta República (1946) - , basicamente, organiza as instituições e os poderes públicos. 

Nesse cenário, segundo o palestrante, a evolução dos princípios constitucionais franceses deve-se à jurisprudência do Conselho Constitucional, à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, além de artigos e do preâmbulo da Constituição de 1946, esse último que trata dos direitos econômicos e sociais. “São intepretações construtivas e audaciosas. Damos um certo alcance ao enunciado e não apenas nos dedicamos a encontrar a ‘verdade’ do texto”, explicou. Segundo JEAMMAUD, os direitos e liberdades fundamentais convivem no país com esse desafio de serem consagrados pela proteção jurisdicional e por normas internacionais em temas como liberdade de expressão, sindical, direito à saúde, religião, entre outros. 

Com relação ao Direito do Trabalho, o professor explicou que houve uma mudança nos anos 80. “Até então, se falava pouco daquilo que denomino de direitos e liberdades nas relações de trabalho”. Segundo JEAMMAUD, na década de 60, eram comuns, por exemplo, as interferências das empresas com relação às vestimentas dos trabalhadores e até mesmo a imposição de exigências “celibatárias” a aeromoças. “A partir desse período, se começa no país a falar também das garantias de direitos também no local de trabalho”, disse. 

JEAMMAUD também fez uma distinção entre os direitos trabalhistas específicos e os não específicos, esses últimos não decorrentes da relação de trabalho em si, mas que a tocam (ex: liberdade de usar símbolos religiosos, de expressão, de endereço, etc). “Há uma limitação ao enquadramento das limitações possíveis, ou seja, o direito das pessoas no trabalho só pode ser restringido se justificado pelo tipo de tarefa e de forma proporcional ao que se pretende”, explicou. Segundo o professor, os direitos e liberdades individuais não específicos são obrigatórios a todos os atos dos empregados, contratos, convenções coletivas, etc. Caso haja exceções, a exemplo de uma mudança de endereço por um alto executivo, as mesmas pressupõem um acordo com o empregado. Apesar do texto constitucional francês não prever explicitamente uma sanção à violação dos direitos e liberdades fundamentais no trabalho, há punição pelo seu descumprimento. “A demissão por conta da violação de um direito fundamental é considerada nula”, esclareceu. 

Para Antoine JEAMMAUD, a constitucionalização das liberdades e dos direitos fundamentais, movimento que vem ganhando corpo no país, vem influenciando as leis francesas. “Tornar constitucional é se tornar um obstáculo a uma mudança legislativa ou um fundamento para ela”, disse. Em alguns casos, explicou professor, o alcance desses enunciados é um desafio. “Na questão da previsão do direito ao trabalho e ao emprego, por exemplo, a obrigação recai sobre o Estado, que deve praticar políticas públicas laborais para coibir a despedida por razões econômicas”.

Na conclusão de sua palestra, o professor falou do desafio do país, no qual a palavra liberdade tem um grande peso, em especial após a Revolução Francesa, de equilibrar a liberdade da empresa com proteção ao emprego. “A garantia deve ser para as pessoas físicas e também as jurídicas. É a grande ambivalência do Direito do Trabalho. Estamos sempre com a balança na mão”, finalizou. 


* Texto produzido com a colaboração do juiz Fábio Gomes (Amatra 1/RJ). Confira abaixo comentário do magistrado sobre a palestra.

“No Brasil, houve uma positivação detalhada dos direitos sociais, com grande ênfase no Direito do Trabalho. Talvez por isso apenas no início do século XXI tenhamos nos dado conta de que há outras dimensões dos direitos fundamentais dos empregados para além do que já prescreveu a Constituição de 1988. Foi muito interessante a exposição do professor, não só pela retrospectiva histórica e pelo panorama atual do Direito do Trabalho francês, mas também porque nos permitiu verificar que os chamados direitos não específicos acabaram por aproximar a enxuta Constituição francesa de 1958 da analítica Constituição brasileira de 1988. Agora, lá como cá, a jurisprudência preencheu lacunas e promoveu uma intensa reconstrução hermenêutica dos direitos fundamentais dos trabalhadores. De um jeito ou de outro, eles se tornaram a argamassa normativa de um amplo bloco de constitucionalidade".

 

Fotos: Alexandre Alves

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