O Fórum Nacional para a Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), reunido hoje (30/9), na sede da Anamatra, decidiu encaminhar moção pública destinada a revelar o engano presente na ideia de que a exploração econômica dos atores mirins configura mera “participação” e não trabalho; e, bem assim, para defender a competência material da Justiça do Trabalho para apreciar os casos de autorização do trabalho infantil, inclusive no meio artístico e desportivo. A manifestação do FNPETI, que tem entre as entidades integrantes da Anamatra, deverá ser encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF) onde o assunto está sendo alvo de intensa discussão.
O vice-presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, participou da reunião e, ao formular a proposta de moção, afirmou que a entidade tem um longo histórico de colaboração com as entidades que lutam contra o trabalho infantil. “Esta é uma batalha comum a todos nós e estamos combatendo o bom combate”, disse ele, que também fez um completo relato sobre o atual debate em torno da competência da Justiça do Trabalho para julgar os pedidos de alvará de trabalho infantil, inclusive o artístico.
O magistrado relatou que o Tribunal de Justiça de São Paulo e os Tribunais Regionais do Trabalho da 2ª e da 15ª regiões, juntamente com os respectivos Ministérios Públicos, recomendam administrativamente o reconhecimento da competência da Justiça do Trabalho. Reportou, ainda, a experiência do Mato Grosso. “Todas essas instituições reconhecem a competência da Justiça do Trabalho para julgar os pedidos de autorização para o trabalho infantil. A partir disso, o que se verificou é que o número de autorizações para esse tipo de trabalho diminuiu drasticamente”, enfatizou.
Entre 2005 e 2010, segundo dados apresentados por Feliciano, documentaram-se, pelos dados da RAIS, 33.173 autorizações de trabalho para menores de 16 anos, o que equivaleria a 15 autorizações diárias, nos mais diversos locais, desde em lixões e oficinas até atividades de pastoreio, no comércio e no meio artístico. À época, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina eram os estados com maior número de autorizações. Somente em São Paulo registraram-se mais de 11 mil autorizações, inclusive em atividades consideradas insalubres e que podem ser classificadas entre as piores formas de trabalho infantil, conforme as definições da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em sua Convenção 182.
Anamatra no STF
Especificamente sobre a competência para autorização do trabalho infantil artístico, Feliciano observou que a Anamatra protocolou petição de ingresso como "amicus curiae" nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 5326. A ação foi proposta pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT) com a finalidade de discutir (e afastar) a competência dos juízes do Trabalho para autorizar o trabalho artístico infantojuvenil, ao que se opõe a Anamatra.
A entidade defende a competência da Justiça do Trabalho para julgar os casos de trabalho infantil, inclusive no meio artístico. Para a ABERT, porém, "a autorização para participação de menores de idade em manifestações artísticas, não possui natureza trabalhista, mas eminentemente civil".
Recentemente, outrossim, a Anamatra solicitou ao STF definição quanto à competência da Justiça do Trabalho a respeito de autorização para toda e qualquer modalidade de trabalho infantojuvenil. A questão é objeto da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 361 ajuizada no Supremo com pedido de medida cautelar.
A entidade contesta a vigência do parágrafo 2º, do artigo 405, e caput do artigo 406, ambos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e do artigo 149, inciso II, da Lei nº 8.069/1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A alegação é de que estes dispositivos não foram recepcionados pela Emenda Constitucional nº 45/2015, que atribuiu à Justiça do Trabalho competência para todo e qualquer litígio pertinente às relações de trabalho.
De acordo com a Anamatra, ademais, o ECA não atribuiu qualquer competência aos juízes da Infância e da Juventude para darem autorização de trabalho. Sustenta que apenas há referência da competência para dispor sobre participação em espetáculos públicos e seus ensaios, assim como em concursos de beleza, “o que não implica necessariamente em relação de trabalho”. Já a CLT, conforme a entidade, dispôs sobre a atribuição do antigo juiz de menores – atual juiz da Infância e da Juventude – para o fim de conceder autorização de trabalho ao menor.
Na ADPF, a Anamatra sustenta que, por meio da Emenda Constitucional nº 45, o legislador constituinte passou a atribuir à Justiça do Trabalho, no inciso I, do artigo 114, a competência para todas as ações que envolvem relação de trabalho “ampliando o conceito até então contido no artigo 114 para julgar dissídios individuais da relação de emprego, na redação pretérita da CF 1988”. Esta nova discussão abrangerá, pela sua própria literalidade, os contratos de trabalho com crianças e adolescentes e as respectivas autorizações.
A associação pede a concessão da liminar para a suspensão da eficácia dos dispositivos questionados e, no mérito, que seja proclamado que a autorização para trabalho ou “participação” de eventos (com natureza de relação de trabalho) de menores de idade deve ser submetida à Justiça do Trabalho e não à Justiça comum estadual. O relator da ADPF 361 é o ministro Gilmar Mendes.
Segundo Feliciano, para o apoio público do FNPETI à tese que atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para apreciar pedidos de autorização para o trabalho infantojuvenil – inclusive o artístico – é um marco sociopolítico de interpretação evolutiva que a Anamatra propõe. “Oxalá essa moção sensibilize os ministros do STF, repercutindo o sentimento dos segmentos sociais mais diretamente envolvidos”, afirmou o vice-presidente.
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