Oferecer aos magistrados brasileiros um panorama sobre o funcionamento do Poder Judiciário em Portugal. Esse foi o objetivo do juiz de Direito Joel Timóteo Ramos Pereira, adjunto do gabinete de apoio do Conselho Superior da Magistratura, e do juiz desembargador do Tribunal de Relação de Coimbra Luis Miguel Ferreira Azevedo Mendes ao encerrar as atividades científicas desta quinta-feira (17/3) do 6º Congresso Internacional da Anamatra. A mesa de debates foi presidida pelo presidente da Amatra 1 (RJ), André Bittencourt Villela.
Ao iniciar a discussão, o juiz Timóteo Pereira fez uma exposição detalhada do funcionamento da organização política em Portugal, incluindo a divisão dos Poderes e as precedências protocolares do Estado. No âmbito do Poder Judiciário, explicou as subdivisões dentro das primeira e segunda instâncias, bem como da instância superior: Tribunal Constitucional e Supremo Tribunal de Justiça, esse último restrito às matérias de direito e não de fato. (clique aqui para ler a apresentação do juiz)
O jurista ressaltou a prevalência das decisões judiciais sobre as de quaisquer autoridades, bem como a obrigatoriedade das mesmas para todas as entidades públicas e privadas. O palestrante pormenorizou a divisão do sistema português, onde há uma separação entre os tribunais de judiciais (comuns) e os de competência administrativa e fiscal, além do Tribunal de Contas e dos Julgados de Paz (instância facultativa para solução de questões de natureza cível). Os Tribunais do Trabalho, explicou o painelista, estão inseridos dentro dos de competência especializada dos tribunais judiciais.
A questão da gestão, inspeção e disciplina do Poder Judiciário foi outro ponto abordado pelo painelista. Em Portugal, há três Conselhos: Conselho Superior da Magistratura, Conselho Superior do Ministério Público (o MP integra o Judiciário em Portugal) e o Conselho dos Oficiais de Justiça (inspeção dos servidores).
A especificidade do Ministério Público em Portugal foi outro ponto abordado por Timóteo Pereira. “Ao Ministério Público compete representar o Estado e defender os interesses que a lei determinar, bem como, nos termos da lei, participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania, exercer a ação penal orientada pelo princípio da legalidade e defender a legalidade democrática”, disse, ao resaltar também que o órgão goza de estatuto próprio e de autonomia.
Justiça do Trabalho
O juiz desembargador do Tribunal de Relação de Coimbra Luis Miguel Ferreira Azevedo Mendes fez uma explanação sobre a organização da Justiça do Trabalho em Portugal e falou também das reformas da organização Judiciária Portuguesa. (clique aqui para ler a apresentação do desembargador)
Segundo ele, há uma diferença substancial entre o Poder Judiciário brasileiro e o português. “O Brasil organizou-se a partir da ideia da Constituição e nós estamos construindo a partir da reflexão da organização judiciária, do dia a dia, da prática e das novas funções que vêm sendo introduzidas”, explicou, ao destacar que essa diferença é uma tradição na só portuguesa, mas de toda a Europa.
O magistrado falou da origem da Justiça do Trabalho em Portugal, ainda no Estado Novo, quando havia uma dependência ao Executivo e um único grau de recurso das decisões – o Supremo Tribunal Administrativo. “Os tribunais do trabalho, ao contrário dos outros, estavam completamente dependentes. Os juízes eram nomeados pelo Ministro e fiscalizados por estruturas do Ministério das Corporações”, explicou. Essa realidade só viria a ser alterada após a revolução democrática de 1974 que passou a colocar os tribunais do trabalho inseridos nos judiciais e com cobertura em todo o território nacional. Além disso, extinguiu as comissões de conciliação.
O desembargador também comentou as inovações pelas quais o Poder Judiciário vem passando em Portugal, com um novo foco. “Hoje, temos de entender o papel dos tribunais no sistema político, como órgãos que lidam com a questão das normas, da gestão e da competência e com desenho para objetivos de eficiência social claros”, disse, ao ressaltar o grande interesse público na questão da administração da justiça.
Ao final de sua exposição, citou as reformas que o Poder Judiciário português vem passando desde 2008 de forma experimental e por fases em comarcas-piloto. “Mas a reforma é cara e sem dinheiro não é possível fazê-la sem dano para as organizações”, alertou. A reforma portuguesa abrange os seguintes aspectos: novo modelo de competência, nova matriz territorial e novo modelo de gestão.