A conferência de abertura do 6º Congresso Internacional da Anamatra, realizada nesta segunda-feira (14/03), emocionou os magistrados do Trabalho que estiveram na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. O ministro Carlos Ayres Britto, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), falou aos mais de 120 juízes sobre “Estado Constitucional e os Direitos Fundamentais”.
O ministro iniciou sua explanação lançando ideias que, segundo ele, devem ser compreendidas para o bom entendimento do fenômeno jurídico e da Constituição brasileira em particular. Nesse aspecto, falou do Direito como obra-prima do pensamento universal. “É o maior engenho da humanidade, que jamais concebeu algo tão articulado como o sistema de Direito Positivo”, destacou.
Ao citar pensadores como Bobbio, Aristóteles e Tobias Barreto, o vice-presidente do STF falou de sua concepção do Direito como instrumento da ordenação da convivência do homem em bases racionais e idealmente justas. “O Direito não é um regalo dos deuses, ele é produto da história e do ser humano”.
E se o Direito é a obra-prima do pensamento universal, para o ministro Ayres Britto a Constituição deve ser entendida e vivida como obra-prima do pensamento jurídico. “Ela [a Constituição] surgiu para se opor ao Estado, que se tornara autoritário e prepotente por excelência. A Constituição governa quem governa. Ela é obra-prima do pensamento jurídico na medida em que colocou o Estado no seu devido lugar. É a fonte que nos inspira, a bússola que nos guia e o ímã que nos atrai – tudo ao mesmo tempo. E é dever de cada um de nós, no processo de aplicação e interpretação do Direito, voltar a ela”, conclamou o ministro do STF.
Mas na visão de Ayres Britto, a importância da Constituição não vem sendo compreendida, na prática, pelos profissionais do Direito que, segundo ele, são conservadores e preferem a segurança jurídica à justiça. “O Direito é bom, o problema é o modo de conceber e praticá-lo no Brasil. Nós padecemos de um patrimonialismo intelectual: interpretamos os textos normativos de modo que a letra mate o espírito. Usamos os direitos individuais para matar os fraternais, sociais e políticos”, alertou.
Para o ministro Ayres Britto, a mentalidade dos operadores do Direito não é digna da Constituição. E a solução para esse problema, segundo ele, está na vontade subjetiva da Constituição, o que transcende o pensamento lógico e a tecnicidade. “O problema dos juízes é sentimental, é de consciência, de inteligência emocional, de sensibilidade e de humanismo”, opinou.
“Eu me preocupo com o ser dos juízes, não com o fazer dos juízes. O autoritarismo dos juízes compromete a autoridade dos juízes. Muito mais importante do que impor respeito é impor-se ao respeito. A diferença é de qualidade. Precisamos de juízes claros no modo de falar e de escrever, juízes falando para a sociedade, para a população. Magistrados com senso de realidade, capazes de abrir a janela do Direito para ver a vida vivida da sociedade, do seu Luiz, de seu José, de dona Maria. É muito mais importante ser gente do que ser a gente”, frisou.
Ayres Britto finalizou sua intervenção falando da importância do sentimento e da valorização dos conceitos de honestidade, independência e solidariedade. “Quem não solta as amarras do navio chamado coração talvez fique condenado ao pior modo de ficar à deriva, no próprio cais do porto. Só assim daremos sentido e propósito à vida e à aventura humana, dignificando a magistratura brasileira”. O ministro foi aplaudido de pé pelos congressistas.