A edição desta quinta-feira (1º/7) do Jornal do Brasil traz artigo do presidente da Anamatra, Luciano Athayde Chaves, intitulado “Terceirização e corrupção eleitoral”. Confira abaixo a íntegra do texto.
Terceirização e corrupção eleitoral
*Por Luciano Athayde Chaves
Neste ano de eleições gerais, muitos projetos são apresentados aos candidatos como prioritários para agenda dos próximos governos (federal e estaduais). De certo, temas voltados para a garantia de melhores condições para os trabalhadores vão surgir e deverão nortear discursos no decorrer da campanha eleitoral.
Novas sugestões sempre são bem-vindas, mas não se pode olvidar os temas que já se encontram em discussão e que merecem apreciação urgente, em razão de seus atuais contornos, como é o caso da terceirização no serviço público.
Há diversos projetos de lei tramitando no Congresso Nacional sobre esse assunto. Os magistrados do Trabalho, por meio de sua associação nacional, acompanham de perto pelo menos cinco proposições que tratam de terceirização.
Algumas delas despertam maior preocupação, ao tratarem do tema com viés de ampliação do instituto, inclusive nos setores rural e público. O receio da magistratura do Trabalho é o de que alguns desses projetos, caso prospere sua aprovação, ao invés de darem proteção ao trabalhador, reduzam ainda mais seus direitos.
À mercê desse tipo de modalidade de contratação no serviço público está a espantosa possibilidade de este mecanismo ser utilizado como subterfúgio para práticas de corrupção, prometendo-se, até em tempo de eleição, postos de trabalho terceirizados em troca de votos.
No intuito de inibir essa prática, temos na Lei nº 12.034 de 2009 um importante avanço, pois seu artigo 41-A afirma que, entre outros fatores, constitui-se captação de sufrágio o fato de um candidato oferecer ou prometer – em troca de voto – emprego ou função pública.
E no sentido de proteger ainda mais as instituições – e principalmente os trabalhadores – de promessas eleitorais desse jaez, o parágrafo 2º do mesmo artigo permite que as sanções previstas sejam também aplicadas contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fito de obtenção de voto.
Nessa hipótese se enquadra o candidato que estiver concorrendo nas eleições – e também fizer parte da administração pública – que pressiona, por exemplo, os funcionários da instituição (inclusive terceirizados) a votar nele para, por exemplo, se manter no cargo que já ocupa. Aqui, além de um crime eleitoral, pratica-se uma agressão à dignidade do trabalhador.
Não se pode olvidar que a terceirização, desafortunadamente, já está bem enraizada nas instituições públicas brasileiras. As despesas com terceirização tiveram um crescimento de 14% em 2009 em relação a 2008, conforme relatório prévio divulgado, do Tribunal de Contas da União sobre as contas do governo da República. E a percepção é a de crescimento nesse processo de gestão de pessoas no setor público.
Na raiz do problema está a opção de se converter a prestação do serviço público por meio do preenchimento de cargos, mediante certame público, pela contratação de empresa prestadora de serviço.
Ainda que haja razões a defender essa opção, a experiência tem mostrado que tal mecanismo não recruta profissionais preparados, além de se constituir porta aberta para a quebra do princípio da impessoalidade, com forte possibilidade de captação ilícita de votos em período eleitoral.
Outro aspecto importante é perceber que – no que se refere ao meio ambiente psicológico do trabalho – o próprio terceirizado dá conta de seu caráter supletivo e precarizado dentro do sistema de trabalho de um dado órgão público. Nesse meio, dizer-se “terceirizado” (geralmente sem orgulho) é assumir algo transitório e desprestigiado, é se considerar menor que o outro.
Por isso, a correta regulamentação da terceirização é mais um passo que, além de propiciar melhor manuseio da máquina pública, pode se somar a outros que vêm na direção de diminuir a corrupção no país.
Iniciativas populares, como as capitaneadas pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), têm resultado em importantes avanços na legislação eleitoral, e mostram que os brasileiros estão cada vez mais atentos às questões que envolvem a higidez do processo eleitoral.
Independentemente de quem venha a conduzir os destinos dos governos de nosso país nos próximos anos, é imprescindível que se preserve a supremacia da ordem constitucional e que se proponha a discutir o crescimento da terceirização de mão de obra em nosso país, em ordem a inserir esse tema no rol das condições de trabalho progressivamente precarizantes, aspecto que viola frontalmente o preceito constitucional da valorização do trabalho.
*Luciano Athayde Chaves é juiz do trabalho no Rio Grande do Norte e presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra)