Tenho acompanhado o noticiário e
deparo-me com uma onda de prisões de figurões
envolvidos em falcatruas realizadas pela Polícia
Federal com ordem de juízes federais e,
concomitantemente, vejo a revolta de colegas e do
público em geral no momento em que os mesmos são
liberados pelos próprios juízes que ordenaram a prisão
ou por seus pares em instâncias superiores.
Colegas afirmam que o país não tem leis rígidas, que
os juízes não são severos e, principalmente, que as
pessoas envolvidas nesses crimes tem grandes posses e
que, por isso, não ficarão muito tempo na cadeia.
Em parte o povo tem razão mas, se olharmos a nossa
volta, perceberemos que isso acontece em todos os
setores. Na saúde se você tem recursos financeiros
poderá contratar os melhores médicos com
especializações realizadas nos grandes centros ou até
mesmo fora do país, poderá também utilizar-se dos
melhores hospitais particulares com equipamentos de
última geração que diagnosticam com precisão doenças
diminuindo assim, sensivelmente, os riscos da
intervenção cirúrgica. De outro lado temos o SUS que na
sua grande maioria encontra-se desaparelhado, com
falta de médicos e sem leitos suficientes para atender
as necessidades dos enfermos além, é claro, das longas
esperas em filas para receber atendimento médico o que
resultará, no mínimo, em maiores sofrimentos advindos
da dor sem contar com o próprio óbito.
Na engenharia acontece algo similar. Para a
realização de uma obra existem profissionais
especialistas em várias áreas, iluminação, fundação,
arquitetura, decoração tudo para que a obra tenha
solidez e beleza e satisfaça o gosto do proprietário.
Já aqueles que não possuem recursos chamam apenas um
bom pedreiro e alguns ajudantes e seguem em frente com
a obra porém sofrendo todo o tipo de risco de uma
possível e provável incorreção e até mesmo, em alguns
casos, levando a obra ao desabamento.
Em sendo assim poderíamos elencar ainda diversos
outros exemplos em que poderíamos constatar que a
influência do poder econômico é decisiva para delinear
os caminhos a serem atingidos pelo cidadão. E, é claro,
na Justiça não seria diferente.
Cumpre informar, primeiramente que, as leis
brasileiras não tem tantos erros como apontam alguns
especialistas, pois, muitas delas, são feitas por
grandes e renomados juristas com alto poder de
avaliação e elaboração. Cabe ainda dizer que elas são
sim iguais para todos. Porém como acontece em outras
áreas o poder econômico exerce influência no deslinde
da causa e, não estamos falando aqui de corrupção, e
sim de habilidade, poder de convencimento,
inteligência, dedicação, organização e busca dos
melhores resultados.
Para o leitor entender citaremos um exemplo,
imaginemos que um banqueiro seja preso por desvio de
verbas dos correntistas e/ou do governo. Imediatamente
este, detentor de grandes posses, contratará um dos
melhores escritórios de advocacia do país que, em
geral, possui de 100 à 300 advogados, para tentar sua
liberação. Contratado o escritório de advocacia,
imediatamente é formado um grupo que confeccionará a
petição no mesmo dia para o juiz que ordenou a prisão.
Não satisfeito já encontram-se de prontidão advogados
das sucursais destes escritórios de advocacia em
Brasília com profissionais especializados em tribunais
superiores que são acionados para conseguir a liberação
perante as cortes extraordinárias.
Em geral o réu é primário, tem bons antecedentes,
residência fixa e não oferece perigo para investigação
criminal não havendo por isso necessidade de ser preso
preventivamente até mesmo porque este tipo de prisão é
extremamente pernicioso e condenável a nível nacional
e internacional já que ninguém pode ser privado de sua
liberdade sem o devido processo legal. Portanto não há
juiz que possa legalmente manter na cadeia referidos
figurões que, libertos, recorrerão reinteradamente das
decisões por longos anos até que as discussões cheguem
ao Supremo Tribunal Federal.
Não podemos esquecer que a lei que não permite a
permanência desses empresários na prisão é a mesma
para o ladrão de galinha porém este último
dificilmente irá ter uma defesa a contento e será preso
infinitamente até que uma alma caridosa lembre-se do
pobre coitado e resolva realizar sua defesa.
Vale lembrar que, infelizmente, essa é a lógica do
sistema. Portanto, para que o cidadão tenha serviços
dignos ou até mesmo de alto padrão precisa de posses
pois sem isso não haveria nem mesmo profissionais
habilitados a realizar serviços dessa natureza.
Em sendo assim espero que, após a leitura deste
ensaio as pessoas entendam que a Justiça é para todos,
porém o direito de defesa englobando o asseguramento
de todos os direitos previstos na legislação é para
poucos.
Por isso intitulei este artigo de pobre justiça rica
já que aos olhos do povo a justiça dos ricos é pobre
pois não prevalece já que não é efetivamente ou a
contento concretizada em virtude da ampla gama de
recursos e da excessiva demora na prestação
jurisdicional final.
Quero deixar claro que, neste ensaio, estou apenas
apontando as causas reais do não aprisionamento da
maior parte das pessoas que possuem estrutura
econômica avantajada. Soluções existem e podem ser
implementadas como, por exemplo, o fortalecimento e
estruturação da Defensoria Pública e leis mais rígidas
e que visem a efetivação das punições de crimes
considerados de relevância social ou de colarinho
branco não tratando assim os desiguais de forma
igual.
Acredito diante desta realidade que a mitológica
deusa Themis (deusa da justiça) deva, nos dias de
hoje, retirar a venda de seus olhos e julgar sim, com
parcialidade sob esse aspecto levando em consideração o
status social do acusado e os efeitos de sua conduta
em relação a comunidade utilizando assim essas duas
diretrizes como termômetro para a aplicação da pena e,
o que é principal, para a efetivação real da
punição.
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(*) Conselheiro da OAB