SALTO DE CIVILIDADE
1. Luigi Ferrajoli, Eugenio Raul Zaffaroni e Juarez Tavares indicaram as condições atuais para regras universais, com um “novo salto de civilidade”. Apontaram para o rejuvenescimento do Direito, trazendo-nos coragem e entusiasmo.
Ocorreu em evento da Emerj - Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, no Webinar Internacional: "A Constituição da Terra, a Crise e o Direito Penal", momento 1h20m do vídeo adiante, de 15 de janeiro de 2.021, já com 3.145 compartilhamentos e disponível em,
2. No Direito do Trabalho, mesmo ou exatamente, nos dias de pandemia, os aperfeiçoamentos se impõem.
A redução de jornada de trabalho é discutida em vários países, especialmente na França e Japão, conforme notícia do Jornal da Universidade de São Paulo,
https://jornal.usp.br/atualidades/reducao-de-jornada-de-trabalho-e-discutida-em-varios-paises/
A Espanha prepara experiência de 4 dias de trabalho, na semana,
https://www.poder360.com.br/internacional/espanha-concorda-em-testar-jornada-de-trabalho-de-4-dias/
3. Atuando na Justiça do Trabalho, tem-se a obrigação de lembrar que as controvérsias sobre limites das horas de trabalho são as mais frequentes, nos processos judiciais.
Uma pesquisa divulgada neste ano, sob o título “horas extras” em “Assuntos no TST”, tem “o Ranking de Assuntos mais Recorrentes no TST em 2020”, constando estas em primeiro lugar,
http://www.tst.jus.br/web/estatistica/tst/assuntos-mais-recorrentes
4. Aqueles que estamos junto ao Direito do Trabalho sabemos que o respeito social aos limites das horas de trabalho ainda não está confirmado. Inúmeras e frequentes são as controvérsias.
A estrutura estatal tem dificuldades para a fiscalização e exame judicial, dos mais diversos regimes de horários de trabalho.
Em outras esferas, já se viu que o controle “técnico” e o “participativo” são complementares e não excludentes; talvez, aqui, se faça útil.
Já foi dito, por Paulo Todescan Lessa Mattos, “O Novo Estado Regulador no Brasil – eficiência e legitimidade”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, pg 32, em situações mais gerais que:
“o termo accountability, em inglês, tem sido traduzido para o português como responsabilização, prestação de contas ou, ainda, responsabilização com prestação de contas. Contudo, o uso desse termo na literatura inglesa no campo das ciências sociais me parece mais amplo. Não é incomum nessa literatura o uso do termo accountability para qualificar forma de controle democrático de instituições políticas”.
A “inexecução das obrigações”, aliás, todas, também, em outras áreas do Direito, tem tido frequência crescente. Nestes dias, viu-se aula na EMERJ – Escola da Magistratura do Rio de Janeiro, com questionamentos intensos e profundos. Ali, tratando-se de situação inversa ao Direito do Trabalho, estando invertido o polo a merecer cuidado, foi lembrado, pela Desembargadora Cristina Gaulia, no encerramento, o Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078, artigo sexto, inciso V,
5. A evolução social haverá de prosseguir, complementando-se a cada avanço. Desde muito, viu-se que os “interesses morales de la humanidad” e, também, “dignidade de la sociedad“, estão juntos, em documentos de janeiro de 1917, no México, registrados por Sergio Pallares Y Lara, “El Ayer y el Devenir del Articulo 123 Constitucional”, México: Editorial Porruá, 2018, páginas 70 e 71.
6. Caminhamos constantemente, ainda que sem compreender, por inteiro, os nossos passos anteriores. Até mesmo, as primeiras manifestações do “Direito” merecem maior estudo. Talvez, não tenham sido proibitivas e, sim, incentivadoras.
José Eduardo de Resende Chaves Junior percebeu que as primeiras preocupações com as regras de convívio seriam semelhantes a algo que melhor se chamaria de “Direito Nômade”. Ao invés de falar-se em não fixação à terra, apontava-se a melhor sorte com o andar de modo nômade, “El derecho nómada : un paso hacia el derecho colectivo del trabajo desde el "rizoma" y la "multitud”, acessado em março de 2021 e disponível em
https://e-archivo.uc3m.es/handle/10016/3075
7. Persistem e, de certo modo, acentuam-se, mais ainda, as incompreensões, no Direito Penal. Em quase todos os Manuais, se lê que a punição estatal “substituiu” a punição direta dos ofendidos e lesados. Ora, os acontecimentos da História tiveram outro encadeamento, conforme estudos mais atentos.
Viu-se, com Antonie Garapon, “Punir em Democracia”, Editora Piaget, 2001, página 16, que:
“Então, é necessário procurar algures as raízes da pena pública. Mauss defende que a pena legal, a punição do Estado tem raízes religiosas e sagradas. O seu antepassado verdadeiro é a sanção infligida pela transgressão de um interdito sagrado. O seu terreno emocional não é a cólera vingadora de uma família insultada, mas uma reacção de horror colectivo perante um sacrifício. A violação de um tabu suscita a emoção, a indignação e terror. Como o crime sagrado é imediatamente contagioso, ele arrisca-se, tal como uma peste supurante, a envenenar a sociedade por inteiro. Eis fundamentado o carácter imediatamente social, colectivo, global, da pena pública. De resto, é o culpado, e ele apenas, que é necessário atingir e «tratar» para salvar o conjunto do grupo”.
Dito de outro modo, no Direito Penal estatal, a finalidade da pena não se esgota no castigo. A preocupação é maior, ou seja, “religar” a sociedade.
8. O insuficiente entendimento dos momentos anteriores dificulta, todavia, não impede a evolução social. Prosseguimos, ainda que de modo, aparentemente, “errante”.
Os alertas de Cesar Beccaria, “Dos Delitos e das Penas”, em 1761, ainda ecoam como uma ilusão, de ultrapassar as “trevas”. Seu belo e pequeno livro, nos dias atuais, ainda fica melhor na estante junto aos livros de poesia e programas parcialmente concretizados.
9. Ao não termos domínio sobre o passado e seus fantasmas, intensifica-se o medo e desconhecimento do amanhã. Deste modo, alguns retrocessos ocorrem.
Em Capítulo “Crucificado Preventivamente”, foi relatado que “A sentença fez escola no império romano por séculos como um precedente negativo... facilitou aos imperadores seguintes... seguidores... mereciam a pena de morte sem maiores discussões, sem exigir o ônus de provas que eles eram realmente perigosos”, Detlef Liebs, “Perante os Juízes Romanos”, São Paulo: Saraiva, 2018, 1ª edição, 2ª tiragem, página 149.
9. Hoje, ainda, é escassa a previsibilidade sobre os rumos da produção e toda organização econômica. A análise profunda tem sido acompanhada de propostas, por serem construídas e que já tem urgência. Assinalem-se as mais recentes pesquisas econômicas:
a) Tecnofeudalismo, Cédric Duran,
https://outraspalavras.net/outrasmidias/a-hipotese-do-tecnofeudalismo/
b) Deslocamento do capitalismo, Ladislau Dowbor,
https://dowbor.org/wp-content/uploads/2020/05/Dowbor-O-capitalismo-se-desloca-Edicoes-SescSP-2020.pdf
c) Rentismo desvinculado, Mariana Mazzucato,
https://outraspalavras.net/mercadovsdemocracia/dowbor-le-mariana-mazzucato/
d) Perda do dinamismo e rentismo, Michael Hudson e Pepe Escobar,
Pierre Salama, do Egito, desde muito estudioso da América Latina, escreveu, nestes dias, sobre o “Contagio viral, contagio económico: riesgos políticos en América Latina”, Pierre Salama.- 1a ed.- Ciudad Autónoma de Buenos Aires: CLACSO; Montevideo: ALAS, 2021, Libro digital, PDF.
10. Efetivamente, estamos diante de situações inéditas, anteriores ao que possa ser chamado como “novo”. Tem-se a sensação, embora não corresponda à realidade, de estar em “vazio histórico”.
Desejamos conhecimentos mais coerentes e promissores. Isto, sim, “todos sabem” e os heróis da ficção cantam, provisoriamente,
Crianças e altos executivos, “com frequência, fazem o mesmo tipo de perguntas”, como diz Kai-Fu Lee, in “Inteligência Artificial”, Rio de Janeiro: Globo Livros, 2019, página 10, ao relatar suas palestras sobre Inteligência Artificial.
11. O reconhecimento do ineditismo dos desafios é um primeiro passo. A construção de algo verdadeiramente “novo”, que supere a antigo “normal” depende de posturas criativas e sábias.
Alguém já disse:
“Quando envelhecemos, todos os demais parecem ser jovens e
Quando rejuvenescemos, nem todos os demais aparentam ser velhos”.
(*) Ricardo Carvalho Fraga - Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
Desembargador do Trabalho no TRT RS
Porto Alegre, em abril de 2021