- INTRODUÇÃO
Nas três últimas décadas tem sido o recorrente o debate em torno da ampliação dos canais de participação do conjunto da magistratura nas decisões administrativas ou de gestão tomadas pelos tribunais, considerando que o Judiciário, inclusive do ponto de vista histórico, se ressente de efetiva democracia interna capaz de compartilhar fração de poder eminentemente público entre o maior número de mulheres e homens integrantes dos seus quadros.
Estamos aqui a tratar, no presente ensaio, registre-se, apenas de aspecto relacionado ao deficit de democracia interna da Justiça, sem examinar, contudo, outras questões afetas ao perfil mais geral do Poder Judiciário brasileiro, de raiz conservadora quando não escancaradamente avesso ao exercício de qualquer papel contra-hegemônico em uma sociedade profundamente desigual, do ponto de vista econômico e social. E assim ocorre sobretudo quando os temas relevantes revestidos de caráter político ou não, incluindo aqueles do Direito do Trabalho, do Direito Penal, do Direito Civil, do Direito Previdenciário e do Direito Tributário, chegam ao Supremo Tribunal Federal para a decisão definitiva.
Seria desarrazoado, por outra vertente, refutar de plano a existência de fragmentos significativos de justiça responsáveis pela concretização de Direitos Humanos ou de Direitos Fundamentais das minorias políticas, por parte da magistratura comprometida com os valores consagrados na Constituição da República e no Direito Internacional, presentes essas manifestações judiciais de afirmação do ser humano como o centro da atenção, a razão de ser da vida em sociedade humana, em todos os ramos e instâncias do Poder Judiciário.
São segmentos do Judiciário os quais resistem a quaisquer tentativas de dilaceramento dos direitos do trabalho, assim como remam eles contra a maré midiática do poder econômico em prol do direito penal do inimigo, do Lawfare como mecanismo de perseguição política e de distração dos alienados ou daqueles sujeitos propensos a acreditar na adoção de semelhantes soluções trágicas recentes geradoras do holocausto para o enfrentamento dos problemas gerados pelo sistema do lucro e da riqueza econômica concentrada, a qualquer custo.
Deixemos para outra eventual oportunidade a análise crítica em torno da função política do Poder Judiciário, quando do exame judicial de temas prontos para alterar de maneira radical relações diversas travadas na sociedade.
O recorte escolhido a seguir está circunscrito às eleições diretas para os cargos de direção dos tribunais, sem a exigência de mudança na Constituição da República. Para a respectiva conformação, na verdade, sequer seria necessário acrescer texto normativo algum, no máximo, a extirpação de dispositivos regimentais os quais trafegam desafiando a via ampla do Estado Democrático de Direito, assim pensado em todas as células da sociedade, notadamente quando se trata da gestão da coisa pública.
As associações de magistrados no Brasil, com especial destaque para a Anamatra, têm construído, ao longo das três últimas décadas, sucessivos estudos e travado destemida luta em defesa das eleições diretas para os cargos diretivos dos tribunais, indo da tentativa da aprovação de dispositivo expresso na Constituição até propugnar, nos últimos anos, pela simples alteração das normas regimentais dos órgãos do Poder Judiciário.
Nos anos 1990 e início dos anos 2000, tão elevado fora o grau de envolvimento na causa que, não raro, chegava a se projetar a eliminação de todas as mazelas, com o consequente fim dos graves problemas do Judiciário a partir da implementação das eleições diretas internas.
Hoje, dotado de olhar mais crítico, tendo em conta ainda, frise-se, as experiências recentes em torno do papel político do Judiciário no Brasil, percebe-se que, além da existência de controles externos dotados de caráter democrático, na sua composição e atuação, tal como restara aprovado pela Anamatra no ano de 2003, conforme deliberação do seu Conselho de Representantes, o que não é o caso do CNJ- Conselho Nacional de Justiça, cujos conselheiros são escolhidos pelas cúpulas das cúpulas, o Judiciário precisa ser repensado de maneira mais abrangente.
De qualquer modo, as eleições diretas para cargos de direção dos tribunais não perderam a sua vitalidade, muito menos desapareceu a necessidade de democracia interna, embora se saiba ser por demais reducionista ou estreita a solução para todos os problemas fincada nessa única âncora.
A partir de voto apresentado no Regional sobre a matéria, traz-se agora à tona as razões explicitadas para reconhecer o direito constitucional da democracia interna no âmbito do Poder Judiciário, com as respectivas eleições diretas, sem exigir mudança alguma no texto maior, mas tão somente, quando for o caso, alterações de normas internas as quais contrariam preceitos fundamentais inarredáveis.
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(*) Juiz do Trabalho desde 27 de abril de 1992, ex-presidente da Amatra 10, Anamatra e ALJT.