Para entidades representativas da magistratura, MP e polícia, norma gera insegurança dos agentes no desempenho de funções públicas.
Supremo | Sessão STF analisa validade de dispositivos da lei de abuso de autoridade Para entidades representativas da magistratura, MP e polícia, norma gera insegurança dos agentes no desempenho de funções públicas. Da Redação quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025 Atualizado às 18:01 Compartilhar ComentarSiga-nos no A A
Nesta quinta-feira, 27, o STF, em sessão plenária, começou a analisar a validade de dispositivos da lei de abuso de autoridade (lei 13.869/19), que define crimes cometidos por agentes públicos no exercício de suas funções.
O julgamento envolve cinco ADIns movidas por entidades representativas da magistratura, do MP e da polícia, que alegam que a norma viola princípios como segurança jurídica, separação dos poderes e razoabilidade, além de gerar insegurança no desempenho das funções institucionais desses agentes.
A sessão foi destinada à oitiva das sustentações orais. O julgamento foi suspenso e será retomado em data ainda não definida.
STF julga validade de dispositivos da lei de abuso de autoridade.(Imagem: Rosinei Coutinho/SCO/STF)
Entenda
As ADIns em análise no STF foram propostas por diversas entidades representativas, como a AMB - Associação dos Magistrados Brasileiros, a ANPR - Associação Nacional dos Procuradores da República, a ANPT - Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, entre outras, para contestar vários dispositivos da lei de abuso de autoridade.
As entidades alegam que os artigos impugnados da norma violam princípios constitucionais fundamentais.
Argumentam que há afronta ao princípio da tipicidade penal, pois alguns dispositivos estabelecem crimes vagos e com termos genéricos, permitindo interpretações subjetivas e arbitrárias.
Sustentam, ainda, que a norma compromete a segurança jurídica, uma vez que a criminalização de certas condutas judiciais gera insegurança no exercício da magistratura.
Também apontam violação ao princípio da intervenção penal mínima, que determina que o direito penal deve ser aplicado apenas em casos de extrema necessidade, o que, segundo os autores das ações, não se verifica no contexto da lei questionada.
Além disso, alegam que a norma desrespeita os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, ao prever sanções penais para atos que, no máximo, deveriam ser tratados como infrações administrativas ou submetidos a revisão judicial.
Por fim, defendem que há afronta ao princípio da independência judicial, pois a criminalização de decisões jurisdicionais comprometeria a liberdade dos magistrados para atuar de forma imparcial.
Na ADIn 6.238, proposta pela ANPT e ANPR, foi levantada a violação ao princípio da separação dos poderes, por supostamente interferir na atividade jurisdicional ao estabelecer sanções criminais para atos praticados por magistrados e membros do MP no exercício de suas funções.
Já na ADIn 6.302, os proponentes também alegaram ferimento ao princípio do regime democrático e à harmonia e independência entre os Poderes.
Inconstitucionalidade
O advogado Alberto Pavie Ribeiro, representando a AMB e a Anamatra como amicus curiae, defendeu a inconstitucionalidade de dispositivos da lei de abuso de autoridade. Segundo ele, a norma introduziu novos tipos penais que comprometem a independência judicial e a segurança jurídica, ao criminalizar condutas inerentes à atividade jurisdicional.
Argumentou que a legislação anterior já previa sanções para magistrados, mas com redação mais técnica e proporcional. Destacou ainda que a criminalização de decisões judiciais viola a imunidade funcional dos juízes, gerando insegurança e desconfiança na magistratura.
O advogado criticou a desproporcionalidade das punições e a quebra do princípio da intervenção penal mínima, uma vez que muitas condutas poderiam ser resolvidas por meio de recursos ou sanções administrativas. Além disso, apontou que alguns dispositivos utilizam tipos penais abertos, permitindo interpretações arbitrárias.
O advogado Aristides Junqueira Alvarenga, da banca Aristides Junqueira Advogados Associados S/S, representando a ANPR - Associação Nacional dos Procuradores da República, a ANPT - Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho e a Conamp - Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, sustentou a inconstitucionalidade da lei em questão.
Aristides criticou a redação da lei, alegando que afronta a LC 95, que estabelece diretrizes para a elaboração de normas, e viola o princípio da taxatividade penal.
Segundo o causídico, a imprecisão nos dispositivos amplia indevidamente os tipos penais, tornando subjetiva a criminalização de condutas. Como exemplo, citou o artigo que prevê punição para investigações iniciadas sem "justa causa fundamentada", sem definir o que isso significa.
Também questionou a criminalização de atos como a suposta demora injustificada em investigações, argumentando que a ausência de prazos claros pode levar à punição arbitrária de autoridades.
Por fim, defendeu que a lei repete dispositivos já previstos no Código Penal e questionou sua utilidade. Para ele, o direito penal não pode ser influenciado por ideologias momentâneas, e a lei de abuso de autoridade, como está redigida, pode abrir margem para interpretações excessivamente amplas, comprometendo a segurança jurídica.
A advogada Ana Vogado, da banca Machado Meyer Advogados, também defendeu a inconstitucionalidade de dispositivos da lei de abuso de autoridade. Ela argumentou que a norma cria tipos penais abertos e imprecisos, gerando insegurança jurídica e enfraquecendo a independência do Poder Judiciário.
Afirmou que a criminalização de decisões judiciais pode intimidar magistrados, transformando a revisão jurisdicional em mecanismo de pressão e controle indevido sobre a atividade judicial.
Defendeu que o combate ao abuso de autoridade deve ser feito pelos meios corretos e não por meio de normas punitivas genéricas, que podem levar ao chamado "apagão das canetas", onde magistrados evitam decidir por medo de punições. Destacou que a autonomia do Judiciário é essencial para a proteção da separação dos poderes e dos direitos fundamentais.
Além disso, apontou que a lei, ao impor penalidades a magistrados, deveria ter sido aprovada por meio de lei complementar e de iniciativa do STF, o que não ocorreu.
Constitucionalidade
O advogado da União, João Pedro Antunes Lima da Fonseca Carvalho, destacou a importância da lei de abuso de autoridade para coibir excessos de agentes públicos e equilibrar o poder estatal com as liberdades individuais.
Ele ressaltou que a norma revisou a legislação de 1965, adequando-a aos princípios democráticos, e que exige dolo específico para punição, afastando riscos de criminalização indevida.
Argumentou que, após cinco anos de vigência, a lei não gerou insegurança jurídica nem comprometeu a atuação das instituições.
O advogado Delio Lins e Silva, representando o CFOAB, sustentou que a lei é essencial para proteger a advocacia e os cidadãos contra abusos cometidos por servidores públicos de todas as esferas.
Ele refutou a tese de que a norma seria uma "cruzada contra a magistratura" e reforçou que o objetivo é punir excessos de qualquer agente estatal, incluindo policiais, promotores e delegados.
Destacou ainda que abusos são frequentes no país, especialmente no interior, e que a legislação visa garantir que os servidores públicos respeitem as mesmas regras impostas a qualquer cidadão.
Por fim, defendeu que a lei não compromete a independência da magistratura e está alinhada a princípios como proporcionalidade e intervenção penal mínima.
O advogado Francisco Felippe Lebrao Agosti, da banca Figueiredo & Velloso Advogados Associados, representando o IGP - Instituto de Garantias Penais, defendeu que a norma reforça a responsabilização de agentes públicos que abusam do poder de forma dolosa, sem violar a Constituição.
Ele refutou alegações de insegurança jurídica e aumento da litigiosidade, destacando que, após cinco anos de vigência, tais previsões não se confirmaram. Citou ainda a mudança de posicionamento da AGU, que passou a reconhecer a validade da norma.
Sustentou que a lei não é novidade no ordenamento jurídico, exige dolo específico para caracterização do crime e protege agentes públicos contra denúncias infundadas. Por fim, pediu a improcedência das ações e a declaração da constitucionalidade da lei.