As reclamações constitucionais foram usadas antes do esgotamento dos processos na Justiça do Trabalho em 82% dos casos nos quais houve decisão do Supremo Tribunal Federal sobre vínculo de emprego, durante um período de sete meses.
Isso significa que ainda não havia decisão definitiva das instâncias ordinárias ou do Tribunal Superior do Trabalho antes da chegada desses casos ao STF. O próprio Supremo entende que esse esgotamento é uma exigência para as reclamações.
O dado é de uma pesquisa divulgada nesta quinta-feira (2/5), feita pelo Núcleo de Extensão e Pesquisa “O Trabalho Além do Direito do Trabalho” (NTADT), do Departamento de Trabalho e Previdência Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP), em parceria com a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).
O estudo analisou 1.039 decisões (monocrática e colegiadas) proferidas pelo STF em reclamações constitucionais entre julho de 2023 e fevereiro de 2024. A Anamatra já havia divulgado uma primeira pesquisa em outubro do último ano.
Assim como na primeira pesquisa, o NTADT considerou reclamações relativas a sete atividades profissionais: trabalhadores autônomos de carga, trabalhadores por demandas ou em plataformas digitais, advogados associados, representantes comerciais, trabalhadores em salões de beleza, terceirizados e pejotizados.
A conclusão da associação quanto aos novos dados é que a reclamação vem sendo usada como instrumento de revisão das decisões da Justiça do Trabalho.
Nesta quinta, durante um painel no Congresso da Anamatra (Conamat), Silvana Abramo — desembargadora aposentada do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, professora, membro do NTADT e uma das coordenadoras da pesquisa — disse que “a reclamação é usada constantemente e de forma intensiva para cassar e reformar decisões da Justiça do Trabalho, desconsiderando o processo legal”.
Outra conclusão da pesquisa é que, em 66% das decisões do STF analisadas, não houve “aderência estrita ao precedente utilizado como paradigma para admissão da reclamação constitucional”. Ou seja, segundo os pesquisadores, o precedente apontado na reclamação não era totalmente aplicável ao caso discutido na Justiça do Trabalho.
O estudo ainda constatou que 52% das decisões do Supremo reanalisaram fatos e provas — o que, em tese, não pode ser feito pela via da reclamação. Foram consideradas apenas decisões em que os ministros mencionaram fatos e provas no corpo da fundamentação, descartadas aquelas com mera citação de decisões de origem que continham tais elementos.
Em 65% dos casos houve devolução dos autos para novo julgamento na origem ou apreciação do mérito pelo próprio STF. Já em 21% deles, o Supremo afastou a competência da Justiça do Trabalho e ordenou o envio para a Justiça comum. A soma desses percentuais representa o percentual de reclamações acolhidas pelos ministros.
Para a Anamatra, isso configura “usurpação” do artigo 114 da Constituição, que estabelece as competências da Justiça do Trabalho. A partir das decisões do STF, a associação vê uma “fragilização” dessa competência, “com redução de sua capacidade para avaliar fatos e provas”.