Liminares da Justiça do Trabalho determinam que a Vale retire trabalhadores de áreas próximas de duas barragens no Pará, de forma preventiva. Uma delas é a barragem de Pera Jusante, localizada no município de Parauapebas, onde há 353 funcionários. A outra é a barragem Mirim, na mina Salobo, em Marabá, onde estão mais de 1,4 mil.
As barragens não estão em risco iminente. Mas o Ministério Público do Trabalho (MPT) afirma ter encontrado muitos trabalhadores na Zona de Autossalvamento (ZAS) - local abaixo do nível da barragem, onde não há tempo suficiente para socorro. O MPT fiscalizou essas barragens entre 23 e 25 de novembro. Como não houve acordo com relação ao prazo de retirada dos funcionários, o órgão ajuizou ações civis públicas.
A barragem Mirim, do Projeto Salobo, está sendo ampliada para armazenar 280 milhões de metros cúbicos de água e rejeito de mineração. Cerca de 21 vezes o volume da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), que rompeu em janeiro de 2019.
Segundo o procurador do trabalho Leomar Daroncho, que integra o Grupo Especial de Atuação Finalística (Geaf), desde os incidentes em Minas Gerais, nas barragens de Mariana e Brumadinho, o MPT passou a ter uma maior preocupação em atuar de forma mais preventiva.
Nos dois casos, a fiscalização não detectou sérios riscos para rompimento das barragens. Mas, lembra Daroncho, a barragem de Brumadinho também tinha parecer de que era estável. “Essas situações não são 100% controláveis. É sempre possível que uma ação humana ou da natureza desestabilize isso, como uma chuva extraordinária ou a ação de explosivos dentro da mina”, diz.
Por isso, afirma, foram feitos os pedidos para a retirada de trabalhadores das ZAS, exceto os estritamente necessários à operação e manutenção, conforme prevê a Lei nº 12.334, de 2010. A norma estabelece a Política Nacional de Segurança de Barragens, de acumulação ou disposição de água ou rejeitos minerais.
Depois de Brumadinho, em 2020, a lei incluiu o parágrafo 2º no artigo 18-A estabelecendo que “somente se admite na ZAS a permanência de trabalhadores estritamente necessários ao desempenho das atividades de operação e manutenção da barragem ou de estruturas e equipamentos a ela associados”.
Além da retirada dos trabalhadores “não essenciais”, o MPT ainda pede treinamentos e capacitações periódicas aos empregados e orientação sobre rotas de fuga. Além da instalação de mecanismos de monitoramento e alarme nas barragens.
A juíza Suzana Carvalho dos Santos, da 2ª Vara do Trabalho de Parauapebas, obrigou a empresa a fazer a retirada urgente, em até 24 horas, de trabalhadores de área de risco próxima à barragem Pera Jusante, com exceção dos essenciais à manutenção da barragem.
Na decisão, destaca que a inspeção do MPT constatou que diversos trabalhadores não sabem como proceder ou em que sentido se dirigir no caso de emergência. “Por óbvio, muito mais desnorteados ficariam em uma situação de perigo real - fato que, infelizmente, resultaria potencialmente na morte de vários desses trabalhadores.”
A juíza ainda determina treinamento específico de segurança para todos os funcionários. Além da instalação na ZAS de sistema de alarme e monitoramento das estruturas das barragens, por geotécnico, durante todo o período com trabalhadores na área de risco (ação civil pública nº 0000184-50.2022.5.08.0126).
Em Marabá, a juíza Amanda Cristhian Mileo Gomes Mendonça, da 2ª Vara do Trabalho, declarou que “embora exista formalmente o Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM), não estão sendo adotadas medidas eficazes para que as pessoas que se encontrem na ZAS, possam, de fato, conhecê-lo e executá-lo em uma possível situação de emergência".
Ainda de acordo com a magistrada, mesmo que a barragem Mirim não esteja em situação de iminente de rompimento, outros fatores de perigo foram apontados pelo MPT, decorrentes da localização da barragem, de detonações constantes e de grandes alteamentos. A Vale e a Salobo Metais foram obrigadas a cumprir 31 cláusulas em 60 dias, sob pena de multa diária de R$ 100 mil por item infringido (processo nº 0000080-85.2022.5.08.0117).
Para o presidente da Associação Nacional de Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Luiz Colussi, pesquisas revelam que o investimento na prevenção é muito mais barato do que o custo da reparação dos acidentes, além de representar melhoria da produtividade e da satisfação profissional dos trabalhadores. “A segurança de quem trabalha não pode ser negociada ou relativizada sob qualquer pretexto”, diz.
Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa da Vale informou por meio de nota que a empresa e a Salobo Metais “estão adotando as medidas para o cumprimento das decisões, bem como a continuidade do diálogo com a Procuradoria do Trabalho, sempre atendendo aos parâmetros legais cabíveis”.
Na nota, reforçam o seu compromisso com a saúde e a segurança dos empregados e ressaltam que “as barragens da Pera Jusante, em Parauapebas, e do Mirim, em Marabá, têm métodos construtivos em etapa única e a Jusante, metodologias mais seguras e com construção em maciço de aterro compactado, sendo certo que para essas estruturas o modo de falha liquefação não é aplicável. As estruturas estão estáveis e com Declarações de Condição de Estabilidade (DCE) positivas, operando dentro da normalidade”.