No dia 07/04/2021, foi publicada a decisão do STF que afastou a TR para atualização dos créditos trabalhistas, fixando como índice aplicável o ICPA-E na fase extrajudicial e a SELIC na fase judicial.
O julgamento havia sido encerrado no dia 18/12/2020, último dia antes do início do recesso, quando então se acreditava que o STF havia decidido de forma definitiva a polêmica que girava em torno do índice de atualização dos débitos trabalhistas.
Ocorre que, desde então, várias dúvidas surgiram na interpretação e aplicação do julgado, especialmente no que diz respeito aos famigerados juros de 1% ao mês e, apesar de transcorridos quatro meses do fim do julgamento, o que se verifica é que a saga ainda continua.
Com a publicação, já são quatro os embargos de declaração que aguardam julgamento no STF. Referida medida judicial visa sanar dúvidas, omissões e contradições acerca do quanto restou decidido pela Corte Suprema, não tendo o condão de alterar, a princípio, o mérito do que restou decidido pelo voto condutor do Relator, Min. Gilmar Mendes, no sentido de que TR não é um índice adequado para a correção dos créditos trabalhistas, devendo ser observado o IPCA-E na fase pré-judicial e, posteriormente, a taxa Selic, nos moldes do que ocorre em relação aos débitos de natureza civil, por aplicação analógica do disposto no artigo 406, do Código Civil.
Os embargos de declaração foram apresentados pela Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC), pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) em conjunto com o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, pela Federação Interestadual dos Trabalhadores e Pesquisadores em Serviços de Telecomunicações (FITRATELP) e pela Advocacia Geral da União (AGU).
Basicamente, as entendidas pretendem, além de que seja dada à decisão uma modulação de efeitos distinta daquela conferida pelo acórdão, que também sejam sanadas as seguintes dúvidas, omissões e contradições:
Identificação do marco inicial para a incidência dos juros, uma vez que a decisão não teria abrangido o período entre o ajuizamento da ação trabalhista e a citação, considerando a previsão contida no § 1º, do artigo 39, da Lei 8.177/91, que prevê juros de 1% ao mês desde o ajuizamento da ação trabalhista.Afastamento de qualquer interpretação que afete a validade constitucional da norma contida no § 1º do art. 39 da Lei nº 8.177/91, pertinente à incidência da taxa de 1% de juros de mora nos débitos trabalhistas, uma vez que não poderia haver exame de pedido não formulado ou, se formulado, desprovido de fundamentação ou argumentação.Revisitação da decisão na parte em que decide pela aplicação da SELIC em sua substituição à TR, tendo em vista a insuficiência atual de tal índice para a recomposição das perdas inflacionárias, como se pretendia com o afastamento da TR.Definição quanto aos índices incidentes em momento anterior à utilização do IPCA-E e da taxa SELIC, uma vez que, no que diz respeito à fase extrajudicial, o acórdão decide como deve ser a incidência do índice a partir de janeiro de 2000, sem dispor, no entanto, a forma do cálculo no período que antecede o referido marco temporal.Além desses aspectos de suma importância para a correta interpretação e aplicação do julgado, o que mais chamou a atenção quando da publicação da decisão foram as contradições identificadas entre a ementa e o próprio acordão, especialmente no que se refere ao evento que caracteriza a fase judicial e, com isso, o momento de incidência da taxa SELIC.
Como bem apontado pela AGU em sede de embargos, a ementa considera como fase extrajudicial "a que antecede o ajuizamento das ações trabalhistas", todavia, tanto a decisão de julgamento quanto o resumo do acórdão determinam "a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil)".
Há, ainda, outro ponto de contradição em relação à forma de correção dos débitos trabalhistas na fase pré-processual. Conforme indicado também pela AGU, o acórdão se refere apenas à incidência do IPCA-E na fase extrajudicial. No entanto, a ementa dispôs que nessa fase incidem, cumulativamente, o IPCA-E e os juros legais, o que colidiria com o disposto no artigo 883, da Consolidação das Leis do trabalho, segundo o qual os juros apenas incidiriam a partir da instauração da fase judicial. Assim, haveria necessidade de esclarecer que a aplicação do IPCA-E na fase extrajudicial se faz de forma isolada.
Por último, há algumas outras incongruências que se referem à aplicabilidade das conclusões do acórdão à Fazenda Pública.
Em suma, quando se imaginou que o julgamento do dia 18/12/2020 encerraria o debate e a acalorada polêmica que gira em torno do índice de atualização dos débitos trabalhistas, decorridos alguns meses ainda se constata que isso está longe de acontecer. Aos jurisdicionados, operadores do direito e a todos aqueles atingidos pela decisão só resta aguardar a análise conjunta dos embargos de declaração pelo STF para ver se, finalmente, será possível alcançar a tão esperada segurança jurídica e a pacificação da controvérsia.
*Paula Corina Santone é advogada, sócia da área trabalhista do escritório Rayes e Fagundes Advogados Associados.