Valor Econômico
Por Isadora Peron
Na próxima sexta-feira, volta à pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) a discussão sobre a proibição do uso do amianto. O julgamento, que a princípio está marcado para acontecer no plenário virtual da corte, vai decidir se é constitucional ou não a lei sancionada em julho do ano passado pelo governador de Goiás, Ronaldo Caiado, que autoriza a extração e exportação do amianto crisotila no Estado. No centro dessa discussão está a cidade de Minaçu, com cerca de 35 mil habitantes, e a mineradora Sama, controlada pela Eternit.
A nova lei goiana ignorou a decisão do STF de 2017, que proibiu a produção de amianto no país por considerá-lo cancerígeno e potencialmente danoso à saúde, especialmente daqueles que trabalham diretamente com o mineral. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), todos os tipos de amianto causam câncer. O uso do mineral já é proibido em mais de 60 países.
Uma fonte ligada ao governo de Goiás, porém, afirma que a batalha jurídica a favor do amianto já é considerada perdida e foi encampada por Caiado apenas como uma estratégia política, para mostrar que ele estava lutando pelos empregos da região.
Com a publicação do acórdão do julgamento em fevereiro do ano passado, a Sama foi obrigada a paralisar as atividades em Minaçu. Em maio, mais de 400 funcionários foram dispensados. Hoje, a mina encontra-se em estágio de “hibernação”. A Eternit mantém cerca de dez funcionários para a manutenção do local.
Prestes a completar um ano do fechamento da mina, a cidade ainda busca alternativas econômicas para substituir a extração do amianto. A prefeitura aumentou os investimentos no turismo e no pequeno produtor, mas a grande expectativa está depositada em outra mina, a poucos quilômetros da unidade da Sama, da empresa Serra Verde, que vai explorar terras raras.
Segundo o prefeito de Minaçu, Zilmar Duarte, espera-se que, até o final do ano, 1,5 mil pessoas sejam contratadas pela nova mineradora, o que gerará outros 3,5 mil empregos indiretos. Questionado sobre o impacto do fim da produção de amianto para a cidade, Duarte compara a situação com Brumadinho (MG), onde o rompimento de uma barragem da Vale matou 270 pessoas em janeiro do ano passado. “Ficou um caos, como Brumadinho, mas sem as mortes”, disse.
O prefeito afirma que o maior problema foi a queda na arrecadação do ICMS ligado à mineração, que deve zerar em 2022. Ele também aponta que a Sama era responsável por financiar os sistemas de saúde e educação do município, o que gerou impacto aos cofres públicos. Zilmar Duarte está no grupo que defende que a exploração do material é segura. “O sentimento na cidade foi de que a decisão do STF (de banir a exploração) foi precipitada”, afirmou.
Ele, no entanto, acredita que o novo julgamento no STF não vai mudar o quadro atual. “A esperança é a última que morre. Mas eu não vejo condição de o Supremo voltar atrás na decisão.” A ação que vai ser julgada a partir de sexta-feira foi apresentada pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), após a lei goiana ter sido sancionada. O julgamento será no plenário virtual, isto é, quando os ministros não se reúnem pessoalmente, apenas apresentam seus votos no sistema eletrônico.
Sobre a ação de 2017, ainda restam pendentes os chamados embargos de declaração, impetrados por entidades que tentam modular a decisão do STF para permitir a extração para exportação do amianto pelos próximos cinco ou dez anos.
A presidente da Anamatra, Noemia Porto, defende que o Supremo considere a lei de Goiás inconstitucional, mesmo que a exploração do amianto seja voltada apenas para o mercado externo. “Vê se faz sentido a gente parar de adoecer e matar trabalhadores brasileiros, e passar a adoecer e matar quem comprar nosso produto na Índia?”, disse.
Ela também aponta que a discussão não é mais sobre a produção do amianto no país, já que atualmente a única empresa que explora o mineral é a Sama.
Noemia relativiza ainda o fato de que o fechamento da mina trouxe impactos na economia de Minaçu. “Quais empregos nós queremos gerar? Nós queremos empregos que o posto de trabalho vai gerar a morte do empregado? Esse posto de trabalho não pode interessar a uma economia que precisa se pautar por um desenvolvimento sustentável”, afirma a presidente da entidade.
Procurado, o governo de Goiás afirmou que não iria se pronunciar sobre o julgamento do STF. A Sama também não quis se manifestar. Já a nova mineradora de Minaçu, Serra Verde, afirmou que não gostaria de ter seu nome vinculado a uma reportagem sobre amianto.