Resolução aprovada no conselho foi criticada por entidades, que viram afronta à liberdade de expressão
O CNJ (Conselho Nacional de Justiça), presidido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli, aprovou nesta terça-feira (17) uma resolução com normas de conduta para juízes em redes sociais que veda, entre outros pontos, a manifestação sobre processos pendentes de julgamento e críticas a decisões de outros magistrados. Também é proibido emitir opinião que demonstre atuação em atividade político-partidária. As vedações foram adaptadas da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, de 1979, para a realidade das redes sociais, e valem para todos os juízes, exceto os do STF, que não se subordinam ao CNJ. O texto estava em discussão no CNJ desde o meio do ano por entidades da magistratura.
Em razão das críticas, Toffoli suprimiu trechos polêmico da versão original da resolução. O principal trecho suprimido é o que recomendava ao juiz evitar interações pessoais, nas redes, que pudessem suscitar dúvidas em relação à sua imparcialidade, especialmente com escritórios de advocacia, membros do Ministério Público e partes em processos. Toffoli excluiu esse trecho justificando que, hoje, as comunicações interpessoais se dão por várias formas, não apenas pessoalmente. Por redes sociais entendem-se, conforme definido na resolução, todas as “plataformas digitais e aplicativos de computador ou dispositivo eletrônico móvel voltados à interação pública e social”, como Twitter, Facebook e WhatsApp. De outro trecho que definia quais são as comunicações afetadas pela resolução foi retirada a expressão “públicos e ou privados” —indicando, assim, que conversas privadas por meio de aplicativos não estão enquadradas no regramento. O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, durante abertura de audiência pública no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
À época, esse trecho sobre as interações pessoais foi visto como uma resposta aos diálogos de Telegram divulgados pelo site The Intercept Brasil. As conversas envolviam o ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro, e procuradores da Lava Jato em Curitiba, sugerindo possível combinação entre juiz e acusação. O placar no CNJ foi de 7 votos pela aprovação da proposta com as alterações feitas por Toffoli, 3 contra e 2 pela aprovação do texto original. Outra mudança sugerida por Toffoli foi a de especificar e detalhar melhor o dispositivo que proibia que o magistrado demonstrasse “engajamento em atividade político-partidária”. O texto agora diz que é vedado ao juiz “emitir opinião que demonstre atuação em atividade político-partidária ou manifestar-se em apoio ou crítica públicos a candidato, lideranças políticas ou partidos políticos”. Uma das preocupações da cúpula do Judiciário era criar normas antes de 2020, quando haverá eleições municipais e a expectativa é que o ambiente polarizado leve magistrados a se expor politicamente.
Ao votar, Toffoli afirmou que era preciso regulamentar a conduta dos juízes nas redes sociais a fim de fornecer balizas aos que querem se expressar com segurança. “Ter um balizamento mínimo será muito mais útil do que não tê-lo." O ministro afirmou que um juiz não se despe do cargo ao escrever em uma rede social e observou que os grandes veículos de comunicação também têm manuais de conduta para evitar que seus jornalistas se exponham e tenham seu trabalho posto em xeque. O conselheiro Luciano Frota, que abriu a divergência, disse que a resolução não é clara e que, embora se argumente que seu objetivo é trazer “recomendações” aos juízes, o verbo empregado no texto, “deve observar”, indica uma ordem. “A norma configura claro cerceamento da liberdade de expressão, afronta ao direito de crítica, prévia censura do livre dizer e flagrante exorbitância do poder de regulamentar”, afirmou Frota.
No início da sessão no CNJ, presidentes de entidades da magistratura falaram contra a aprovação da resolução. “Jamais defendemos que os excessos não fossem punidos. O que defendemos é que este conselho cumpra seu papel, que é o de garantir a liberdade de expressão, não de restringi-la. Quando se regulamenta 'a priori' o comportamento dos magistrados, o que se está negando é a possibilidade de manter aberto o dissenso”, disse Noemia Porto, da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho).
Do mesmo modo, a presidente da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), Renata Gil, e o presidente da Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil), Fernando Mendes, foram contrários ao regramento. O texto aprovado diz que os juízes que já possuírem páginas ou perfis abertos nas redes sociais deverão adequá-las às exigências da resolução no prazo de até seis meses. “A Corregedoria Nacional de Justiça e as demais Corregedorias acompanharão o cumprimento desta resolução”, encerra o texto.
A resolução não traz punições. Eventual descumprimento da resolução pode gerar a abertura de PAD (processo administrativo disciplinar) contra o juiz. As sanções, nesses casos, são as mesmas dos demais processos disciplinares, como advertência e censura.
PRINCIPAIS PONTOS DA RESOLUÇÃO APROVADA
Recomenda-se ao juiz:
Evitar expressar opiniões ou compartilhar informações que possam prejudicar o conceito da sociedade em relação à independência, à imparcialidade, à integridade e à idoneidade do magistrado ou que possam afetar a confiança no Poder Judiciário
Evitar manifestações que busquem autopromoção ou superexposição
Procurar apoio institucional caso seja vítima de ofensas ou abusos nas redes Abster-se de compartilhar conteúdo ou a ele manifestar apoio sem convicção sobre a veracidade da informação, evitando a propagação de fake News.
É vedado ao juiz Manifestar opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de terceiros, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças de outros membros do Judiciário
Emitir opinião que demonstre atuação em atividade político-partidária ou se manifestar em apoio ou crítica públicos a candidato, lideranças políticas ou partidos políticos
Emitir ou compartilhar opinião que caracterize discurso discriminatório ou de ódio, especialmente os que revelem racismo, LGBTfobia, misoginia, antissemitismo, intolerância religiosa ou ideológica, entre outras manifestações de preconceitos relativos a orientação sexual, condição física, idade, gênero e origem
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BRASÍLIA Reynaldo Turollo Jr.