Em artigo anterior, intitulado "Reforma trabalhista - Aplicação das regras para a fixação de reparação por danos morais" discorremos a respeito da proposta de mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, relativamente à inclusão do artigo 223-A a 223-G.
O referido dispositivo versa sobre a reparação de danos de natureza extrapatrimonial decorrentes das relações de trabalho, quando ocorrer a violação, por ação ou omissão, na esfera moral ou existencial do ofendido, que pode ser pessoa física ou jurídica. As novas regras passaram a ter vigência com a edição da lei 13.467/17.
Na ocasião realçamos que no projeto o legislador, ao criar o artigo 223-G, da CLT, indicou 12 (doze) critérios para que fosse fixada eventual condenação, e, ainda, instituiu o teto, em "até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido", para ser estabelecida a reparação.
Destacamos a importância dos parâmetros apontados, considerando que, anteriormente, os juízes trabalhistas arbitravam as indenizações sem qualquer direcionamento, causando, muitas vezes, diferenças consideráveis de valores em comparação com situações semelhantes e que essas distorções geravam insegurança jurídica, além de morosidade na entrega da prestação jurisdicional em razão de interposição de recursos.
No entanto, asseveramos que mesmo antes da norma entrar em vigor, já era objeto de críticas ao fundamento de que não é razoável definir uma reparação adotando-se como base de cálculo o salário do ofendido ou do empregado ofensor. Argumentavam os seus defensores que esse fato gera injustiças, além de supostamente dar um preço para a vida de alguém, na hipótese de morte, por exemplo, do trabalhador.
Nessa linha e, se insurgindo contra a tarifação, foram ajuizadas três ações diretas de inconstitucionalidade, sendo: A ADIn 5870, pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho; a ADIn 6082, pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria - CNTI; e, a ADIn 6069, pelo Conselho Federal da OAB.
Vale a pena frisar que na ADIn 5870, foi afirmado que a tarifação não pode prevalecer, tendo em vista que impõe uma limitação "ao dano extrapatrimonial decorrente da relação de trabalho", fazendo com que o Poder Judiciário se torne "impedido de fixar uma indenização superior à efetivamente devida para reparar o dano ocorrido", e, ainda, é enfatizado que a norma viola o "princípio da isonomia, porque a indenização decorrente de um mesmo dano moral (p.ex.: tetraplegia de um servente ou de um diretor de empresa) teria valor diferente em razão do salário de cada ofendido."
Mecece relevo, igualmente, que já existem decisões declarando a inconstitucionalidade do artigo 223-G, da CLT. E para assim proceder o juiz Titular da Segunda Vara do Trabalho de Nova Lima/MG, Vicente de Paula Maciel Junior, nos autos 001000164.2019.5.03.0165, entendeu que:
Ora, o estabelecimento de tarifa para a reparação de danos (art. 223-G, §1º, 2º e 3º, a CLT), padece de evidente inconstitucionalidade, por afronta aos arts. 1º, III; 3º, IV; 5º, caput e incisos V e X e caput do art. 7º, da Constituição Federal. Isto porque a tarifação dos danos estabelecida ofende o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, a Constituição Federal), ao admitir que a esfera personalíssima do ser humano trabalhador possa ser violada sem a reparação ampla e integral, eis que foram estabelecidos limites e valores módicos e insuficientes, em claro desrespeito ao art. 5º, V e X da CF/88 e com tratamento discriminatório ao ser humano "trabalhador".
O art. 223-G, da CLT, prevê tratamento discriminatório e de menor proteção ao trabalhador em relação aos demais membros da sociedade quanto às reparações por danos extrapatrimoniais, já que em relação a estes se aplicam as regras do CCB, que são mais amplas, sem estabelecimento de tarifas para a reparação e se encontram em consonância com a CF/88 e seus princípios da proteção integral. Restringir o valor da reparação pela dor do trabalhador constitui inegável discriminação e violação aos arts. 3º, IV e 5º, caput, da Constituição da República. O fato de a pessoa humana estar envolvida em relação laboral não torna sua dor menor dos demais membros da sociedade.
Por outro lado, em outros julgados e em sua grande maioria, a norma vem sendo aplicada sem qualquer restrição, presumindo-se, portanto, que está em conformidade com a Constituição Federal em vigor.
Ante o exposto, apesar da polêmica instaurada, entendemos que enquanto não ocorrer o pronunciamento definitivo do Supremo Tribunal Federal a respeito do tema, o artigo 223-G, da CLT, deve ser aplicado sem ressalva.
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*Orlando José de Almeida é advogado sócio do escritório Homero Costa Advogados.
*Bernardo Gasparini Furman é colaborador do escritório Homero Costa Advogados.
Orlando José de Almeida e Bernardo Gasparini Furman