Em reunião com bancada do DEM, eleito critica Ministério Público do Trabalho
Talita Fernandes, Thais Bilenky e Ranier Bragon
Em reunião fechada com deputados do DEM, o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), defendeu mudanças nas leis trabalhistas para que elas se aproximem da "informalidade".
"No que for possível, sei que está engessado o artigo 7º [da Constituição, sobre direitos como 13º salário e férias], mas tem de se aproximar da informalidade", disse o presidente eleito em reunião com deputados do DEM nesta quarta-feira (12), em Brasília.
Bolsonaro voltou a dizer que é muito difícil ser empresário. "Ser patrão no Brasil é um tormento", afirmou.
As declarações do presidente constam de vídeo publicado no Facebook do deputado federal Francisco Floriano (DEM-RJ), que transmitiu parte do encontro ao vivo.
Bolsonaro afirmou ainda que, se tiver clima, vai "resolver o problema" do MPT (Ministério Público do Trabalho).
"O Ministério Público do Trabalho, por favor, se tiver clima, a gente resolve esse problema. Não dá mais para continuar quem produz sendo vítima de uma minoria, mas uma minoria atuante", disse.
O presidente eleito criticou o órgão por não ter hierarquia, comparando com a estrutura militar: "Cada um faz o que bem entende".
No vídeo, Bolsonaro cita o empresário Luciano Hang, dono da rede varejista Havan, um de seus principais apoiadores.
Hang é alvo de um pedido da Procuradoria do Trabalho de Santa Catarina, que solicitou a aplicação de uma multa de R$ 100 milhões a ele por ter tentado influenciar votos de funcionários.
"Luciano Hang, da Havan, de Santa Catarina, está com uma multa de R$ 100 milhões porque ele teria aliciado, obrigado os funcionários a votar em mim", disse, em tom crítico.
O presidente eleito diz que, com as críticas ao MPT, não quer o fim da fiscalização. "Nós queremos que tenha fiscalização sim, mas nós queremos que chegue ao órgão fiscalizado e a pessoa seja atendida como amiga", disse.
Eleito com discurso de liberal na economia, sob a tutela de Paulo Guedes, que será superministro da Economia, Bolsonaro promete fazer reformas estruturais a partir de 2019, entre elas uma nova revisão da lei trabalhista.
Em seus discursos, ele tem dito de forma genérica que pretende fazer novas flexibilizações porque o empresário é desestimulado no Brasil por causa do excesso de direitos dos trabalhadores.
Embora Bolsonaro fale em rever as leis trabalhistas, até agora sua equipe econômica não definiu que modificações fará na legislação atual. Ele excluiu o status de ministério da pasta do Trabalho e dividiu suas atribuições entre Economia, Cidadania e Justiça.
O governo Michel Temer conseguiu aprovar no Congresso a reforma trabalhista e a liberação da terceirização mesmo da atividade-fim.
A reforma trabalhista alterou mais de cem pontos da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), o conjunto de normas que rege as relações de trabalho e que foi editado em 1943, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas.
Bolsonaro também comentou medidas relativas a terras indígenas e quilombolas. "Não demarcarei um centímetro a mais de terra indígena. Ponto final", disse, sob aplausos.
"Não tem mais terra para quilombola também, acabou. Não vou entrar em detalhes, mas isso tem a ver com segurança jurídica no campo", afirmou o eleito. Parte do setor agrícola esteve ao lado de Bolsonaro na campanha.
"Você quer derrubar uma árvore, quer fazer uma coisa legal, é quase impossível, depende de licenças ambientais. Esse problema a gente vai deixar de lado", disse, ao descrever a vida do produtor rural.
Especialistas em direito do trabalho interpretaram com receio a declaração de Bolsonaro sobre informalidade.
Otávio Pinto e Silva, professor de direito do trabalho da USP (Universidade de São Paulo), afirmou que é cabível ter diversificação entre diferentes contratantes no Brasil, desde que isso não altere parâmetros que garantam um "patamar civilizatório mínimo".
Ele disse que devem ser mantidos as jornadas de oito horas por dia e, assim como o presidente eleito, os direitos da Constituição.
"Garantir tratamento legal diferente entre grandes empresas e microempreendedores é uma opção viável. Não é adequado que a flexibilização venha a partir da supressão de direitos", disse.
Para ele, o problema do Brasil não está no direito trabalhista, mas na tributação, com os altos encargos inerentes a um contrato formal.
"A lei 13.467 [da reforma trabalhista] se mostrava uma solução para a informalidade, mas verificamos o oposto 12 meses depois. De2oi7 a 2018, houve a criação de 1 milhão de novos postos informais, chegando a mais de 39 milhões. Não me parece um bom caminho", disse Guilherme Feliciano, presidente da Anamatra (associação dos juizes trabalhistas).
A informalidade atingiu 43% dos trabalhadores brasileiros no fim de setembro, o maior patamar trimestral registrado pela Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua desde que o levantamento começou a separar trabalhadores por contra própria com e sem CNPJ, no fim de 2015.
De acordo com os dados da pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), entre junho e setembro, o país registrou 92,6 milhões de pessoas ocupadas. Dessas, 39,7 milhões não tinham carteira assinada.
Colaborou Paula Soprana