— Eu paguei R$ 250. Por que não posso subir?
— Minha senhora, esta área é só para ministros do Supremo e familiares — respondeu o funcionário que controlava o acesso ao local.
— Mas a Marta Suplicy está lá em cima. Tô vendo daqui, de vestidinho azul, ó. — disse, apontando para ela.
O homem deu um suspiro e disse que a senadora havia entrado com a permissão de um cerimonialista. A convidada desistiu do plano, virou as costas, pegou uma taça do espumante nacional Casa Valduga e saiu cantarolando "Like a Virgin", de Madonna, que tocava ao fundo.
A senadora Marta Suplicy não foi a única "intrusa" da área fechada para ministros do STF e familiares no coquetel para 1.500 pessoas, realizado na noite da quinta-feira (13), para comemorar a posse de Toffoli, que será presidente do STF até 2020. Por volta das 22h, uma leva de mais de 30 convidados conseguiu furar o bloqueio e chegar à área. No grupo estavam o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e uma fila de advogados e juízes que viram a grande oportunidade de garantir a presença na fila do beija-mão do novo presidente. Antes da invasão, um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) dera meia-volta e resolvera ir para casa ao saber que não teria acesso ao espaço VIP e precisaria se acotovelar com os demais convidados no salão principal da casa de eventos Hípica Hall, em Brasília.
Depois da entrada dos penetras, o espaço VIP, no primeiro andar, ficou tão cheio quanto o salão principal. Para receber os cumprimentos, Toffoli optou por descer. O presidente do STF foi recebido com gritos de comemoração pelos integrantes da turma da 90, como se autodenominam os alunos que se formaram com ele na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo. Os convidados, que já tinham desembolsado R$ 250 cada um, passaram a encarar uma fila de cerca de dez minutos para fazer uma selfie com Toffoli. Um dos que posaram para fotos ao lado do presidente do STF foi o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, com quem Toffoli trocava estocadas e alfinetadas durante o governo Dilma Rousseff.
Os advogados criminalistas do alto escalão — que colecionam clientes como o deputado cassado Paulo Maluf, os irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da J&F, o ex-deputado Eduardo Cunha e o presidente Michel Temer — esperavam o fim da festa para se aproximar do ministro. Enquanto isso, abraçavam-se chamando uns aos outros de "mestre" e faziam brindes com uísque Chivas Regal 12 anos. Depois de muitas derrotas judiciais desde o início da Operação Lava Jato, afirmavam, esperançosos, que com Toffoli tudo vai melhorar devido a seu jeito "hábil, receptivo e apaziguador".
O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, um dos poucos que preferiram ficar na cerveja e na caipirinha, dançava na pista. Ele comemorava em alto som que nas últimas 24 horas havia ganhado quatro liminares. "O Brasil está mudando", dizia para emendar em seguida, aos risos, com a seguinte ressalva: "Mas nenhuma delas foi dada pelo Barroso. O Brasil não está mudando tanto assim". Era uma referência ao ministro do STF Luís Roberto Barroso, considerado do grupo linha-dura da Corte, que também se misturava, junto com a mulher, aos convidados, perto do local onde foi montado o bar para a festa. Os ministros Luiz Fux, que tomou posse como vice-presidente, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes prestigiaram o evento. Também estiveram presentes ex-ministros como Nelson Jobim, Cezar Peluso, Ilmar Galvão e Joaquim Barbosa. Na área VIP, Barbosa, tratado como herói por alguns convidados, até atendeu a alguns pedidos de selfie. Mas sua simpatia se foi quando se juntou aos demais convidados no térreo. Lá, não quis mais posar para fotos.
Um dos mais animados da noite, o ministro Luiz Fux atendeu a todos os pedidos de foto. Também deu uma de tiete do comandante do Exército, o general Eduardo Villas Bôas, a quem beijou diversas vezes na testa. Apesar de estar com respirador e em cadeira de rodas devido a uma doença degenerativa, Villas Bôas ficou até meia-noite no coquetel.
Já eram quase 23h quando Alexandre de Moraes, que estudou na turma de 90 do Largo de São Francisco com Toffoli, subiu ao palco para fazer uma homenagem ao colega. Aos gritos de lindo, entoados por um pequeno grupo de mulheres à direita do palco, Toffoli chegou para receber do corintiano Moraes uma camiseta do Palmeiras autografada pelos jogadores.
"Vamos ficar aqui na frente, gente, somos as toffoletes, gente", disse uma das integrantes do grupo de servidoras que atuam no gabinete do agora presidente do Supremo e que ajudaram a organizar o show do cantor Leo Jaime naquela noite. A festa acabou depois das 2h da madrugada, com Toffoli cantando Legião Urbana, a mesma banda que evocou no discurso de posse. Além dos ex-alunos da São Francisco, uma turma que acompanha Toffoli em bate-papo e baforadas em suas incursões a São Paulo, como o médico Raul Cutait e Beto Ranieri, dono da Tabacaria Ranieri, que funciona como ponto de encontro do grupo, bateu ponto na festa.
O evento foi promovido pela Associação de Magistrados Brasileiros(AMB), a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Procuradas, as entidades afirmaram que o valor do ingressodestinado para o pagamento da festa.