Para alguns especialistas, lei dinamiza mercado; para outros, retira direitos
THAIZA PAULUZE
DE SÃO PAULO
Falas contundentes de juízes, advogados, economistas, sindicalistas e empresários marcaram o debate sobre a reforma trabalhista organizado pela Folha na sexta (10).
De um lado, os críticos veem a nova legislação como um grande retrocesso nos direitos dos trabalhadores. Do outro, estão os que acreditam que a reforma trará crescimento econômico e, portanto, menos desemprego.
"Será uma descida ao inferno", definiu Clemente Ganz, diretor do Dieese, que prevê aumento da desigualdade e queda salarial, além de perda de receita para o Estado.
O professor da FGV Gesner Oliveira é otimista. "A reforma ê promissora. A atual legislação não permite investimento nem inovação, fatores que dependem de segurança jurídica."
Sindicalista e representante patronal também divergiram. "Num momento de recessão, como se negocia a relação de trabalho? Dizem que serão criados 2 milhões de novos empregos, mas quais, e em que condições?", questionou Ivone Maria da Silva, presidente do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região.
Ela afirmou que não é contra o fim do imposto sindical obrigatório, que é hoje a principal forma de financiamento dos sindicatos. "Só queremos discutir com os trabalhadores quais serão as formas de contribuição."
Luciana Freire, diretora-executiva jurídica da Fiesp, diz que a reforma permitirá que trabalhadores e patrões negociem sem entraves.
"Por que não posso parcelar as férias em três vezes se desejar? Por que não posso diminuir o horário de almoço e fazer um curso? O empregado pode se casar várias vezes, se divorciar quando quiser, pode fazer tanta coisa, mas não pode decidir o que quer nas relações de trabalho."
O economista Marcel Solimeo, da Associação Comercial de São Paulo, argumenta que a atual legislação é tão detalhista que bloqueia qualquer entendimento. "Dizem que os novos empregos serão precários, mas pergunte a um desempregado se ele aceita um trabalho temporário, veja se ele vai se sentir precarizado ou feliz", afirmou no fórum, realizado no Complexo Aché Cultural, em São Paulo.
O impacto da reforma na Justiça do Trabalho também foi motivo de divergência. O único consenso é de que os próximos meses serão de muitas dúvidas.
"A rapidez com que as regras foram aprovadas deixou pontos obscuros, que podem gerar interpretações diversas e que levarão anos para serem pacificados pelo Judiciário", previu Carlos Eduardo Vianna Cardoso, sócio-coordenador do setor trabalhista do escritório Siqueira Castro.
"O momento inicial será de expectativa e certa resistência natural dos advogados em entrar com ações no bojo da nova norma", segundo Marcel Tadeu Alves, advogado do escritório Peixoto & Cury.
Para o juiz Guilherme Feliciano, presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), a nova legislação "tem lacunas, é atécnica, com vícios e diversas inconstitucionalidades, defeitos que serão sanados pelo Judiciário".
Feliciano nega, porém, qualquer ideia de boicote à lei. "Boicotar? Isso é de uma maldade torturante. Uma das coisas salutares do direito é que os operadores debatam as leis que estão entrando em vigor, em especial as tecnicamente ruins", disse.
Os debates foram mediados pelos jornalistas da Folha Everton Lopes e Laís Alegretti e atraíram 230 pessoas.
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"O que gera emprego não é flexibilização das leis trabalhistas, mas dinamismo da economia e aumento da massa salarial, que elevam poder de compra e contratações"
IVONE MARIA DA SILVA
presidente do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região
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"Essa reforma torna nosso sistema ainda mais complexo. Se alguma mudança tivesse que ser feita, era de simplificação, sem supressão de direitos"
PAULO JOARÊS
coordenador nacional de combate às fraudes nas relações de trabalho do Ministério Público do Trabalho
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"A antiga legislação não permitia investimento nem inovação, fatores que dependem de segurança jurídica. Assim, ela inibia o crescimento sustentável"
GESNER OLIVEIRA
professor do Departamento de Planejamento e Análise Econômica Aplicados à Administração inibia o crescimento sustentável
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"É uma contradição interna da reforma apostar na negociação coletiva quando o aumento de contratos atípicos promove fragmentação jurídica e social que enfraquece os sindicatos"
ANDRÉ GAMBIER CAMPOS
cientista social e pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada)
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"No início, a expectativa é que muita coisa vá parar no Judiciário por resistência de advogados e sindicatos e por pontos pouco esclarecidos pela lei, pois o debate de fato não aconteceu"
MARCEL TADEU ALVES
advogado especialista em direito do trabalho do escritório Peixoto & Cury Advogados