A discussão em torno da clássica dualidade do sistema capitalista – o bem-estar do trabalhador e a necessidade de aumento da produtividade – não é nem um pouco nova, mas parece recém chegada ao Poder Judiciário. Em ofício enviado na última semana ao presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Ricardo Lewandowski, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) requer mudanças na política de metas de produtividades dos juízes, adotada desde 2009 para agilizar a prestação jurisdicional e reduzir o atual estoque de 95 milhões de processos em tramitação. "O Judiciário não é linha de produção", afirmou ao JOTA o presidente da Anamatra, Paulo Schimidt.
A menos de um mês do Encontro Nacional do Poder Judiciário, a associação pede o cancelamento do evento em que os presidentes dos 91 tribunais brasileiros definirão as metas para 2015 e 2016. O encontro está marcado para os dias 10 e 11 de novembro. No ofício aprovado pelas 24 entidades regionais de juízes do trabalho, a Anamatra pede as associações locais de juízes tenham direito de voto na mesma proporção dos tribunais caso não seja possível suspender o encontro. "Pelo modelo atual, o CNJ premia o tribunal que atinge metas e o regime de cobrança vem de cima para baixo sem considerar especificidades, diversidades e gargalos regionais", critica Schimidt.
O requerimento da Anamatra vem após a rejeição pela maioria dos presidentes dos 24 tribunais regionais do trabalho de proposta de meta específica para a saúde dos juízes trabalhistas. É feito ainda depois de o Conselho Nacional de Justiça divulgar que 72,5% dos magistrados consultados no Censo do Poder Judiciário consideram positiva para o cidadão a adoção de metas de produtividade na Justiça. Quando a pergunta é sobre os benefícios para os próprios juízes, porém, o índice de aprovação cai para 61%. A menor aprovação é justamente dos juízes do trabalho (39%), e a maior entre os ministros dos tribunais superiores (78%).
Para o presidente da Anamatra, o processo atual de definição de metas exclui da discussão quem efetivamente deve aplicá-las. "Existem metas fixadas por linguagem hermética, técnico científica que ninguém entende e são impostas aos juízes", pontua, acrescentando que os encontros nacionais dos presidentes dos tribunais deveriam ser transformados em encontros regionais com a participação das associações e cujas metas seriam levadas à aprovação do plenário do CNJ.
Na opinião de Paulo Schmidt, o atual regime tem impacto negativo direto na saúde dos magistrados e na qualidade das decisões. "Não se pode aplicar ao sistema judicial métodos adotados por empresas que competem no sistema capitalista. Não podemos tratar o processo como um item de consumo que pode ser medido com quantidade. Cada sentença é uma peça artesanal, cada caso é um caso", completa.
Por iniciativa do ministro Lewandowski que buscou uma aproximação com as associações de classe depois do racha gerado na gestão do ministro Joaquim Barbosa, os presidentes da Anamatra, da AMB e a Ajufe terão um espaço no Encontro Nacional para falarem sobre os dilemas e alternativas para o Poder Judiciário. "Mas até aí as metas já estarão formuladas para votação. A fala seria apenas um legitimador das metas", diz Schmidt.