Na quinta passada, presidente do Supremo acusou vice de fazer chicana.
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, discursou após a abertura da sessão desta quarta-feira (21) na qual serão julgados recursos dos condenados no processo do mensalão e disse que respeita os colegas de Corte, mas que age para garantir a "celeridade" dos trabalhos do tribunal. Ele afirmou que suas atitudes são pautadas com base no "respeito à sociedade" e que não teve intenção de "cercear os direitos dos colegas".
Na semana passada, a sessão foi interrompida abruptamente após tensa discussão entre Barbosa e o vice-presidente, Ricardo Lewandowski. Barbosa acusou o colega de "fazer chicana", que, no jargão jurídico, significa uma manobra para prejudicar o andamento da ação.
Não me move a intenção de cercear os direitos de colegas." Ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal
"Antes de começarmos a retomada dos embargos gostaria de dizer umas poucas palavras. Como presidente desta Corte tenho a responsabilidade de, respeitados os direitos fundamentais, zelar pelo bom andamento dos trabalhos, o que inclui a celeridade dos trabalhos, uma vez que Justiça que tarda não é Justiça. Todas as minhas iniciativas no tribunal na condição de presidente são com essa intenção", disse.
Barbosa completou que é preciso respeitar "quem paga nossos salários. "Não me move a intenção de cercear os direitos de colegas. [...] É dever do presidente adotar todas as medidas ao seu alcance para que o serviço da justiça seja transparente, célere, sem delongas, até mesmo em respeito à sociedade que é, afinal, quem paga nossos salários."
'Lamentável episódio', diz Lewandowski
O ministro Lewandowski pediu a palavra na sequência e classificou como "lamentável" a discussão com Barbosa na última semana. Ele afirmou que recebeu manifestações de apoio de entidades que representam juízes e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Quero deixar esse episódio de lado porque este tribunal, pela sua história, é maior do que cada um de seus membros." Ministro Ricardo Lewandowski, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal
Com referência ao lamentável episódio da semana passada quero dizer que me senti confortado pelas manifestações formais e explícitas de solidariedade que tive por parte da AMB, Ajufe, Anamatra, do presidente do conselho federal da Ordem dos Advogados do Brasil, de dezenas de editoriais e colunas estampadas no jornais do Brasil. Apoio que recebi de colegas da magistratura de todo o Brasil, de membros do Ministério Público, disse.
Lewandowski disse que vai deixar de lado o episódio em respeito ao Supremo. Quero deixar esse episódio de lado porque este tribunal, pela sua história, é maior do que cada um de seus membros.
'Voto da coragem', diz Celso de Mello
Ministro com mais tempo de atuação no STF, Celso de Mello discursou em seguida e defendeu que todos os magistrados da corte devem ter o direito de manifestar seja qual for sua corrente de pensamento.
O voto vencido é o voto da coragem, é o voto de quem não teme ficar só. É preciso que fique claro que o Supremo, entendido na sua unidade orgânica, é mais importante do que todos e cada um de seus ministros." Ministro Celso de Mello
O episódio supera a esfera pessoal de seus protagonistas para atingir a esfera institucional, motivo que deve gerar séria reflexão dos magistrados. [...]Assim como ninguém tem o poder de cercear a livre manifestação dos que integram os juízes desse tribunal, também os juízes dessa corte têm liberdade de expressar suas posições.
Celso de Mello defendeu Lewandowski ao dizer que o ministro que profere voto divergente da maioria precisa ser respeitado.
"Aquele que profere voto vencido não pode ser visto como um espírito isolado ou uma alma rebelde, pois muitas vezes, como nos revela a história desta corte, é ele que possui o sentido mais elevado da ordem, do direito e do sentimento de Justiça. [...] O voto vencido é o voto da coragem, é o voto de quem não teme ficar só. É preciso que fique claro que o Supremo, entendido na sua unidade orgânica, é mais importante do que todos e cada um de seus ministros.
Barbosa agradeceu as palavras de Celso de Mello mas reafirmou que nunca teve a intenção de cercear a liberdade de um colega. Longe de mim a vontade de cercear a livre expressão de qualquer membro desta corte.
Ministro Ricardo Lewandowski, defendo o direito de vossa excelência de proclamar o que pensa. Sigamos em frente. Caminhamos rumo à quadra em que a coragem de dizer as próprias verdades não será motivo de assombro." Ministro Marco Aurélio Mello
Ele completou dizendo que o mensalão é um processo de "extremo interesse da sociedade brasileira". "Tenho visão bastante peculiar da presidência de um dos poderes da República. Não vejo a presidência do STF como um eco de vontades corporativistas. É algo bem superior a isso."
Marco Aurélio se solidariza
O ministro Marco Aurélio Mello também pediu a palavra para prestar solidariedade a Lewandowski.
Parafraseando Voltaire, afirmo: ministro Ricardo Lewandowski defendo o direito de vossa excelência de proclamar o que pensa. Sigamos em frente. Caminhamos rumo à quadra em que a coragem de dizer as próprias verdades não será motivo de assombro."
Próximos recursos
Será concluída nesta quarta a análise do caso de Bispo Rodrigues, do extinto PL, réu cujo recurso gerou a discussão. Ele pedia para ser punido com base na lei sobre corrupção que valeu até novembro de 2003 e que previa pena menor para o crime.
Lewandowski entendeu que Rodrigues aceitou a vantagem indevida antes de a lei mudar e que, portanto, a pena deveria ser reduzida. Barbosa rejeitou a possibilidade, que pode ter influência no caso de seis réus, entre eles o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.
Após a conclusão da análise do caso de Bispo Rodrigues, serão analisados na sessão desta quarta (21), pela ordem, os recursos de três ex-dirigentes do Banco Rural ( Kátia Rabello, José Roberto Salgado e Vinícius Samarane), depois Marcos Valério e Delúbio Soares.
Na semana passada, o tribunal rejeitou recursos de sete condenados (Emerson Palmieri, Jacinto Lamas, Valdemar Costa Neto, José Borba, Romeu Queiroz, Roberto Jefferson e Simone Vasconcelos).