Um projeto de lei que pretende ampliar a terceirização da mão de obra para todas as atividades de uma empresa tem gerado debates entre empresas, trabalhadores juristas. Isso porque atualmente não existe lei que regulamente esse tipo de trabalho.
Sem lei específica, essas relações de trabalho costumam acabar na Justiça, onde vale entendimento do TST (Tribunal Superior do Trabalho) de que a atividade-fim (caracterizada como a finalidade principal do negócio) não pode ser terceirizada.
A atividade-fim de uma escola, por exemplo, é a educação. Desse modo, a ela pode contratar outra empresa para realizar os serviços de limpeza e conservação, mas não pode terceirizar os professores.
O projeto 4330/2004, de autoria do deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), muda esse entendimento e prevê que qualquer setor, mesmo que seja essencial para o funcionamento do negócio, possa ser terceirizado. O autor diz que o texto surgiu da necessidade de regulamentação dessa relação de trabalho e que não haverá prejuízos para os trabalhadores.
“Hoje, eles estão desprotegidos, porque não há uma regulamentação. De outro lado, há uma necessidade de terceirização, porque as empresas precisam de mão de obra especializada”, explica Mabel. O projeto está na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados e a previsão é que ele volte à pauta no dia 9 de julho.
O texto, porém, virou alvo de discussões no Congresso Nacional e fora dele. Centrais sindicais e representantes da Justiça do Trabalho se manifestaram contra o projeto, temendo que, se aprovado, ele leve à perda de direitos para os trabalhadores.
“O país vai dar um passo atrás se aprovar esse projeto, porque ele tem o viés de precarizar os direitos trabalhistas”, afirma o presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Paulo Schmidt.
Para o juiz, a ampliação da terceirização vai contribuir para a migração de uma importante massa de trabalhadores que hoje são diretos para companhias terceirizadas. “Na verdade, a empresa tomadora de serviços quer diminuir os custos de mão de obra. A partir de um valor fixo, ela pode promover um ‘leilão’ maior de contratos, o que acaba gerando a diminuição dos salários”, afirma.
Sob o mesmo ponto de vista, o Ministério Público do Trabalho já se manifestou contra a regulamentação proposta pelo deputado Sandro Mabel. “É como se esse projeto criasse uma segunda categoria de trabalhador, incentivando a diminuição dos salários, das conquistas sindicais, dos benefícios”, afirma o procurador José de Lima, coordenador nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho do MPT.
“Somos favoráveis a um projeto que discipline essas relações de trabalho, desde que preveja igualdade de direitos, que estabeleça a responsabilidade solidária da contratante”, diz. O argumento dos especialistas é que, no lugar de 10 funcionários, a terceirizada contrata oito pessoas com salário reduzido, maior carga horária de trabalho e benefícios distintos dos diretos.
Especialização
Os empregadores respondem que a ideia não é reduzir direitos nem prejudicar os trabalhadores, mas sim aumentar a possibilidade de contratação de mão de obra especializada. “A terceirização não significa ter o menor preço, mas ter uma mão de obra mais eficiente, mais especializada”, diz o autor do projeto.
“A terceirização já é uma tendência mundial e possibilita mais qualidade, técnica, eficiência, melhoria da competitividade e da produtividade, criando melhores oportunidades de emprego”, afirma Sylvia Lorena Teixeira de Sousa, gerente de relações do trabalho da CNI (Confederação Nacional da Indústria). “É claro que a terceirização tem que ser feita com responsabilidade, segurança jurídica e proteção dos trabalhadores. Deve ser adotada como uma ferramenta de gestão para permitir a competitividade”, acrescenta.
Sobre a possibilidade terceirizar qualquer atividade da empresa, a gerente da CNI diz que a decisão deve ser da empresa e não da Justiça. “De acordo com a dinâmica, o empregador é que vai decidir aquilo que deve ser terceirizado, o que tem ou não que ser protegido”, destaca.
Na última terça-feira (11), representantes do governo e de sindicatos firmaram um acordo para que um projeto de regulamentação da terceirização seja negociado com a participação de todos os atores envolvidos, incluindo empregadores e o Congresso Nacional.