Ronaldo de Oliveira/CB/D.A Press - 10/12/10 Presidente do STF criticou a criação de tribunais, "construídos em praias"
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DIEGO ABREU
No dia seguinte à conturbada reunião entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, e representantes de associação de juízes, os comandantes das principais entidades da magistratura endureceram o tom contra o chefe do Judiciário. Em nota divulgada ontem, acusam o ministro de ter agido de forma "desrespeitosa, premeditadamente agressiva e grosseira". As associações indicam que a presidência de Barbosa é um erro a ser corrigido no futuro. "Como tudo na vida, as pessoas passam e as instituições permanecem. A história do STF contempla grandes presidentes e o futuro há de corrigir os erros presentes", destaca o texto assinado pelos presidentes das associações dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Nino Toldo; dos Magistrados Brasileiros (AMB), Nelson Calandra; e dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), João Bosco Coura.
Na reunião de segunda-feira, o presidente do STFacusou os representantes das entidades de terem atuado "na surdina" pela aprovação "sorrateira" da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 544, que cria quatro Tribunais Regionais Federais (TRFs), que, segundo Barbosa, custariam R$ 8 bilhões anuais - número contestado pelas associações. Durante o encontro, Barbosa afirmou de forma irônica que as novas cortes seriam construídas em "resorts" e "grandes praias".
Ao final da audiência, o ministro ordenou que o vice-presidente da Ajufe, Ivanir César Ireno, abaixasse o tom de voz. Depois de Joaquim Barbosa ter dito que os tribunais foram criados de maneira açodada, Ireno argumentou que o tema havia sido debatido no Conselho Nacional de Justiça(CNJ), em 2010.
Nino Toldo disse ontem que "é inverídico afirmar que o CNJ não teve conhecimento ou oportunidade de apreciar a PEC", pois, segundo ele, o órgão emitiu uma nota técnica em favor da criação dos tribunais. Na nota divulgada nesta terça, as associações acusam Barbosa de "falta de respeito institucional" com os magistrados, a advocacia e o Congresso. "Dizer que os senadores e deputados teriam sido induzidos a erro por terem aprovado a PEC 544, de 2002, que tramita há mais de dez anos na Câmara, ofende não só a inteligência dos parlamentares, mas também a sua liberdade de decidir, segundo as regras democráticas da Constituição", afirmam os presidentes da Ajufe, AMB e Anamatra.
As entidades acrescentam que o modo como Joaquim Barbosa tratou os representantes da magistratura não encontra precedente na história do Supremo e ultrapassa "a liberdade de expressão do pensamento". As associações reclamam, ainda, que, ao permitir que a imprensa acompanhasse a reunião, o presidente do STF"demonstrou a intenção de dirigir-se aos jornalistas e não aos presidentes das associações, com quem pouco dialogou, pois os interrompia sempre que se manifestavam".
Conluio
A relação entre Barbosa e as entidades já estava estremecida. No começo do ano, as associações publicaram notas rebatendo declarações do presidente do STFde que os magistrados têm mentalidade "pró-impunidade" e de que existe um "conluio" na relação entre juízes e advogados. Nelson Calandra devolveu com ironia as provocações feitas por Barbosa na reunião de segunda. Ao Correio, ele afirmou que o novo TRF de Minas Gerais só poderia ser à beira da praia se criarem uma "varinha mágica que transforme a Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte, em mar". "Sentimo-nos constrangidos e entristecidos, muito mais do que indignados, pois o ministro Joaquim Barbosa é tão juiz quanto cada um de nós", disse Calandra.
Questionado sobre o encontro, o ministro do STFRicardo Lewandowski preferiu não polemizar: "Cada qual responde por seus atos e palavras", disse. Barbosa não quis se pronunciar sobre as críticas das associações.
No Senado, o relator da PEC, Jorge Viana (PT-AC), lamentou as declarações de Barbosa. "Não foi de maneira sorrateira. Foi embasada numa sede de justiça que nós temos. Os tribunais regionais frederais ou são implantados ou o caos se instala no Judiciário Federal", disse.
"Sentimo-nos constrangidos e entristecidos, muito mais do que indignados, pois o ministro Joaquim Barbosa é tão juiz quanto cada um de nós"
Nelson Calandra, presidente da AMB