O uso das novas tecnologias de comunicação pelas empresas tem sido um importante fator da precarização do trabalho. Nas últimas décadas o uso de e-mails, celulares ou outros equipamentos de comunicação remota passou a permitir a execução de tarefas profissionais fora da empresa, na residência dos funcionários ou em qualquer local onde se encontrem ao alcance desses modernos meios de comunicação.
Se para as empresas isso significa um ganho extraordinário, para os trabalhadores representa uma extensão abusiva da jornada de trabalho, pois controlados eletronicamente e à distância, ficam praticamente o tempo todo à disposição de seus patrões, sendo obrigados a ficar de prontidão e atender às solicitações durante seus momentos de lazer, e mesmo em finais de semana ou em gozo de férias.
Uma pesquisa feita nos EUA, em 2008, pela Pew Internet & American Life Project, mostrou que quase metade (46%) dos entrevistados indicou um aumento nas horas de trabalho devido ao uso de tecnologias de comunicação; para 49% cresceu também o estresse relacionado à profissão, e para outros 49% ficou mais difícil se desconectar do trabalho mesmo em fins de semana.
Outra pesquisa, divulgada pelo sítio iPNews, revelou que o uso dessas tecnologias aumentou a jornada de trabalho de oito para dez horas diárias; quase 80% dos trabalhadores disseram ser acionados por mensagens no celular mesmo nos momentos de lazer e descanso. Eles descrevem uma realidade que o sociólogo Ricardo Antunes (Unicamp), especialista em relações do trabalho, chamou de “escravização digitalizada”.
No mesmo sentido, Marcio Pochmann, presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e também estudioso das relações de trabalho, afirma que "esse trabalho não é reconhecido, não é remunerado e não há consciência crítica sobre ele", uma situação que afronta a legislação e prejudica a saúde do trabalhador. "Existem doenças que ainda não são percebidas como doenças do trabalho, como a depressão, que são decorrentes desse ritmo frenético", disse.
A decisão da presidente Dilma Rousseff, de 15 de dezembro de 2011, de sancionar uma mudança no artigo 6º da CLT eliminando a distinção entre o trabalho realizado dentro da empresa e o trabalho à distância é, nesse sentido, um grande benefício para o trabalhador. A nova redação assegura que "os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio".
Não há dúvida. Pela nova norma, o uso de celular ou e-mail para contato entre empresas e funcionários passa a equivaler, juridicamente, às ordens dadas pessoalmente aos empregados e devem ser remuneradas na forma de horas extras.
Os advogados patronais alegam, como sempre, que os trabalhadores podem fraudar queixas trabalhistas com base na nova norma. É o velho e senhorial hábito de patrões brasileiros de colocar sob suspeita tudo aquilo que seja contrário a seus interesses. O gerente executivo de Relações de Trabalho da CNI, Emerson Casali, acusou a nova interpretação de gerar “insegurança”.
Na outra ponta, advogados trabalhistas e juízes do trabalho reconhecem os benefícios da nova legislação. O juiz Germano Silveira de Siqueira, diretor de Assuntos Legislativos da Associação Nacional de Magistrados do Trabalho (Anamatra), não tem dúvida a respeito. Para ele, a regra empresarial de “não poder desligar o telefone configura subordinação" e o trabalhador, nessa situação, deve ser remunerado, pois está à disposição da empresa, está de prontidão. A nova regra é um avanço, disse. Com ela cada juiz “estará mais aparelhado com a lei que deixa translúcido que os meios informatizados servem para subordinar o trabalho externo, tornando a prova mais segura".
Embora prometam um mundo de mais liberdade e tempo livre, as novas tecnologias são usadas pelas empresas para aumentar a intensidade do trabalho, prolongar a jornada e ampliar os ganhos do capital, que é de fato o grande beneficiado pelo desenvolvimento científico e tecnológico. A nova interpretação da lei aponta no sentido contrário, o da distribuição desses benefícios também em favor dos trabalhadores. E é contra isso que os capitalistas e seus representantes reclamam.