O articulista Euclides Lisboa, no DC de domingo, a título de discutir a polêmica criada pela tentativa de aprovação da emenda à Lei da "Super Receita" que impediria à fiscalização agir quando constatasse irregularidades quanto à contratação de pessoas em condições típicas de empregado, anotou, entre outras impressões, que para os empregadores, "a emenda é de primeira, retira o tom de ilegalidade dos contratos entre pessoas jurídicas", e que "não adianta as categorias trabalhadoras organizadas quererem um sistema jurídico perfeito ao emprego, se duas em cada três empresas do Brasil, e seus respectivos trabalhadores, permanecem na informalidade ou desocupados". Conclui, afirmando que "o Brasil se atrasou, com uma legislação que só beneficia a elite trabalhadora. Para o resto, ficam as sobras".
Na verdade, a visão do economista,
ao que parece, está distorcida em vários aspectos.
O primeiro ponto a ser questionado é: a quem é (ou
não) conveniente a fiscalização da Receita Federal
poder agir ao constatar contratações irregulares? O
empresário que contrata trabalhadores "na
informalidade" está praticando crime de sonegação
fiscal, pois com isso visa fraudar a legislação
tributária, não pagando as contribuições para a
Seguridade Social e ajudando a aumentar o problema do
financiamento do sistema. Se o auditor-fiscal não
puder atuar, o sonegador fica à vontade para praticar
o delito, gerando a necessidade de se cobrar mais
tributos sobre aqueles que cumprem a lei.
A emenda não retiraria a
ilegalidade, já que a lei continua exigindo a
contratação de trabalhadores subordinados na forma da
CLT e obrigando o tomador do serviço a pagar as
contribuições sociais. Apenas faria com que os
auditores-fiscais se transformassem em "peças
decorativas", pois não mais teriam o poder de exigir o
cumprimento da legislação.
Outro equívoco é o de querer equiparar, sem
embasamento científico, a lei brasileira e a dos
"países avançados". Que países seriam "avançados"?
Seriam os "tigres asiáticos", cujos trabalhadores se
prestam a viver com uma renda de menos de um dólar ao
dia?
A CLT não beneficia apenas a "elite trabalhadora" (aliás, quem seria essa elite?): ela rege as relações de emprego de todos os brasileiros. A informalidade decorre de um fenômeno cultural de desrespeito à legislação como um todo, do qual também faz parte, por exemplo, a invasão de reservas ambientais, o pagamento de propinas, a corrupção. Será que a próxima "emenda" irá propor também a redução dos poderes dos órgãos ambientais e da Polícia Federal?
A Organização Internacional do Trabalho, organismo vinculado à ONU, ao contrário do que defende o articulista, vem instituindo uma luta sem limites contra o trabalho precário, seja nos países "avançados" ou não. Seria recomendável ao sr. economista ler ao menos algumas das recomendações daquele respeitado organismo, antes de escrever seu próximo texto sobre direitos sociais fundamentais.
*Carlos Alberto Pereira de Castro, 41, é Juiz do Trabalho em Blumenau, Presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho da 12ª Região - Santa Catarina e Membro do Fórum Nacional de Previdência Social.