Indicado pelo presidente Lula (PT) para assumir um assento no STF (Supremo Tribunal Federal), Flávio Dino retomará a carreira de magistrado que iniciou em 1994 e se despediu em 2006 para ingressar na política.
Em 12 anos como juiz, Dino ganhou notoriedade e se consolidou como um líder da categoria.
De 2000 a 2002, foi presidente da Ajufe (Associação dos Juízes Federais), quando encampou bandeiras corporativistas da magistratura, ameaçou fazer greve por maior remuneração e travou embates com o então advogado-geral da União, Gilmar Mendes, que agora é decano do STF e o apoia para chegar à corte.
Juízes que ajudaram Dino a chegar à liderança da entidade lembram que desde aquela época ele já tinha o perfil combativo e de enfrentamento que marcaram sua atuação na política.
Historicamente, os integrantes da Ajufe chegavam a um consenso para definir quem seria o presidente. Em 1998, porém, Dino foi um dos líderes do movimento que visava derrotar o então presidente da entidade, Vilson Darós, que tentava a reeleição.
O acordo para evitar uma disputa interna não prevaleceu, e Dino concorreu como vice de Fernando Tourinho. Ambos saíram vencedores e foram protagonistas na disputa por melhoria na remuneração da magistratura federal.
Junto com outras associações de juízes, pressionaram o governo federal e o STF para que fosse concedido o auxílio-moradia a magistrados como forma de melhorar a remuneração da categoria.
Chegaram a ameaçar uma greve no Judiciário, mas recuaram após o Supremo dar uma decisão que garantiu o benefício pleiteado.
Menos de dois anos depois, quando Dino já era o presidente da Ajufe, voltaram a fazer ameaças em busca de mais salário. Na ocasião, a ideia era pegar o embalo de greves de professores universitários e de servidores do INSS para aumentar a pressão por melhorias salariais.
A Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho) iniciou uma discussão sobre uma paralisação, e o então presidente da Ajufe não descartou aderir ao movimento. "Permanecendo o impasse, a tendência é que façamos também essa discussão", disse Dino em novembro de 2001 à Folha.
Além da questão salarial, Dino também foi um defensor dos patrocínios recebidos por entidades da magistratura, que eram contestados porque criavam um vínculo entre juízes e empresas ao mesmo tempo que a categoria tem a missão de se manter imparcial para, eventualmente, impor derrotas judiciais a essas empresas.
Em entrevista à véspera de assumir a Ajufe, o então juiz federal defendeu o fato de companhias privadas terem pagado despesas de viagens de ministros do STF e do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
"A viagem foi organizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros. A Erion e a Nortel não a ofereceram no gabinete de cada um dos ministros. Isso é que não seria aceitável. O financiamento de congressos por empresas é um fato absolutamente normal e acontece há pelo menos duas décadas", afirmou na época.
Apesar da habitual luta corporativista de associações da magistratura, juízes que compuseram o grupo de Tourinho e Dino dizem que ambos tiveram um papel fundamental para mudar o perfil da entidade.
A disputa em 1998 com a diretoria que estava no poder ocorreu porque havia o entendimento de que a Ajufe deveria participar de maneira mais ativa do debate público.
A avaliação de Dino e seus aliados na época é que a entidade só ganharia credibilidade junto à sociedade para pleitear melhorias à categoria caso fosse mais atuante do ponto de vista político.
Na visão de integrantes da entidade, eles tiveram sucesso na missão. E listam alguns avanços do Judiciário que ocorreram nessa época para dar peso à tese. Um deles é a criação, em 2001, dos juizados especiais federais, que, na época, só existiam no âmbito estadual da Justiça.
Também mencionam que, em 2004, o Congresso aprovou uma proposta de reforma do Judiciário que contou com a influência da Ajufe. Na época, o presidente da entidade era Paulo Sérgio Domingues, que tinha sido vice de Dino e, ano passado, tornou-se ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
O projeto aprovado pelo Congresso foi responsável pela federalização dos crimes contra os direitos humanos, uma bandeira da Ajufe, e pela criação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que era apoiada pela entidade, mas tinha oposição de outras associações de magistrados.
Dino ainda passará por sabatina pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, que vai preparar um parecer sobre a nomeação e enviar a análise ao plenário.
Aliados dele afirmam que o histórico será importante para sua atuação no órgão de cúpula do Poder Judiciário. Ele virou juiz aos 26 anos após se formar em direito pela Universidade Federal do Maranhão. Depois, fez mestrado na Universidade Federal de Pernambuco.
Em 2006, deixou a magistratura para concorrer a deputado federal e foi eleito para o cargo pelo PC do B. Em 2014, elegeu-se governador e ficou no posto por dois mandatos.
No início deste ano, foi indicado por Lula para assumir o Ministério da Justiça. No posto, enfrentou desgastes por uma atuação na área de segurança pública vista como ineficiente.
No entanto também se destacou por ser um dos ministros mais atuantes de Lula e com maior poder de oratório para fazer o embate público com a oposição.
Foi à frente da pasta que consolidou a relação com integrantes do STF que deram peso à sua candidatura a uma vaga na corte. Neste ano, ele aproximou-se dos ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, principais interlocutores de Lula no Supremo atualmente e que apoiaram a indicação de Dino para o cargo.